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Re: [Archport] Forma çã o acad é mica e exerc í cio profissional: perguntas afinal com resposta

To :   archport <archport@ci.uc.pt>
Subject :   Re: [Archport] Forma çã o acad é mica e exerc í cio profissional: perguntas afinal com resposta
From :   Vítor Oliveira Jorge <vojorge@clix.pt>
Date :   Fri, 05 Jun 2009 12:40:17 +0100

Title: Re: [Archport] Formação académica e exercício profissional: perguntas afinal com resposta
Do meu ponto de vista de professor universitário desde o ano lectivo de 1972/73, e como “arqueólogo de campo” em directa relação com a primeira actividade, o meu ponto de vista sucintamente é o seguinte:
    

Vitor Oliveira Jorge






On 09/06/05 10:36, "Alexandre Monteiro" <no.arame@gmail.com> wrote:

Pelo que percebi, a resposta do IGESPAR, casuística, partindo de um caso em particular, tenta justificar o indeferimento com o injustificável. Dando de barato que põe os pés pelas mãos (e que o RTA é uma verdadeira aberração, pondo no mesmo plano de de igualdade um passeio pelo campo com o intuito de prospectar a existência ou ausência de materiais cerâmicos e a escavação destrutiva de uma cidade romana inteira, por exemplo), não se compreende como é que a uma licenciatura das "antigas" (quais? as de 4 ou as de 5 anos?) equivale hoje em dia a um grau de mestrado dos "novos". 

É que, para todos os efeitos (legais, académicos, profissionais), um mestre "bolonhês" é equivalente, em termos de qualificação, a um mestre dos de antanho. Mais, se nos reportarmos ao caso da arqueologia, nada na legislação habilita particularmente um mestre  a ser director de escavação - friso, não é o número de semestres, de aulas frequentadas, de teses elaboradas que torna alguém um bom director de escavação. O que o habilitará é apenas a prática, a tutoria que vier a experimentar sob a direcção de colegas mais velhos e o traquejo (à falta de melhor termo) que só muitos anos de terreno, de congressos e de artigos publicados e revistos pelos seus pares confere.

Mas vejamos o que diz a lei. De acordo com o Decreto-Lei n.o 74/2006, de 24 de Março, sabe-se que:

"A análise da experiência europeia mostra que ao 1.o ciclo correspondem, por norma, 180 créditos, isto é, três anos curriculares de trabalho.
Para algumas profissões—poucas—são internacionalmente exigidas formações mais longas, correspondentes a quatro, cinco ou seis anos curriculares de trabalho."

E cita algumas dessas excepções, pormenorizando três casos distintos:

1- "Contam-se neste grupo, desde logo, aquelas que são objecto de normas comunitárias de coordenação das condições mínimas de formação, como as constantes da Directiva n.o 2005/36/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Setembro (Jornal Oficial, n.o L 255, de 30 de Setembro de 2005), onde se incluem os médicos, os enfermeiros responsáveis por cuidados gerais, os médicos dentistas, os médicos veterinários, os enfermeiros especializados em saúde materna e obstetrícia, os farmacêuticos e os arquitectos."

2 - "Por outro lado, aquelas cuja duração mais longa resulta de uma prática estável e consolidada na União Europeia, como é o caso de algumas áreas de engenharia de concepção."

3 - "Finalmente, aquelas a que, por força de normas legais nacionais actualmente em vigor, deva ser fixada uma duração superior a 180 créditos."

Ora, não me parece que a arqueologia que se exerce em Portugal se encaixe em algum destes casos. Mais: querer fazer passar a atribuição de uma direcção de escavação apenas a quem demonstre ter mestrado é querer, ao arrepio da lei, promover " a adopção de formações artificialmente longas " o que, fora os contexto europeus de referência acima descritos, "não é naturalmente aceitável, não só pelo que representaria em desperdício de recursos, como pelo prejuízo em que se traduziria para os estudantes dos estabelecimentos de ensino superior portugueses."

Sabendo-se que a grande maioria dos licenciados que terminam agora o seus cursos bolonheses opta por ingressar directamente no mestrado - uma tendência que só beneficia as universidades que, como bem sabemos, estão a precisar de propinas como de pão para a boca - por medo de lhes ser negado o exercício da profissão, pergunto-me então: concluído o mestrado, estando potencialmente dotados de qualificação suficiente para dirigir uma escavação, que experiência terão estes putativos directores, tendo em conta que terão passado a maioria deles, quando muito, três ou quatro meses a remover entulho, a desmatar jazidas e a lavar materiais? Que aconteceu ao tirocínio de anos e anos, em que um recém-licenciado ia adquirindo conhecimentos de escavação, de interpretação de cortes, de identificação de materiais, de traquejo, enfim? Que currículo terão para apresentar ao IGESPAR?





2009/6/5 Presidente APA <presidente@aparqueologos.org>
FORMAÇÃO ACADÉMICA E EXERCÍCIO PROFISSIONAL:
COMENTÁRIOS A UMA RESPOSTA

Face às profundas transformações que se têm produzido no contexto do
exercício da profissão de arqueólogo, e também na formação académica
na área científica de arqueologia, a APA tem procurado debater esta
questão no sentido de propor às entidades competentes a alteração do
enquadramento jurídico da profissão.

Nesse âmbito, dirigimos ao IGESPAR uma série de perguntas concretas,
para as quais obtivemos a resposta que agora divulgamos. A posição
que IGESPAR nos transmitiu sobre os critérios que adopta para análise
dos pedidos de autorização para trabalhos arqueológicos (PATA) –
embora espoletada a partir de um caso concreto – tem um alcance
significativo no exercício da profissão, pelo que nos parece
importante não só divulgá-la como comentá-la.

Este comentário, bem como toda a documentação de suporte do mesmo,
pode ser consultado em http://aparqueologos.org/ , destacando-se em
síntese os seguintes pontos:

-       numa interpretação extensiva da Lei, decorrente do vazio
criado pela extinção da carreira de arqueólogo na administração
pública, o IGESPAR vem dizer que para dirigir trabalhos arqueológicos
a habilitação académica adequada é a conclusão do 2º ciclo de estudos
superiores na área específica de arqueologia;

-       a definição de que o IGESPAR faz de “área específica de
arqueologia” é baseada na formação que inclua “trabalho arqueológico
de campo que confira prática profissional curricularmente comprovada
e avaliada”, tendo como critério de reconhecimento da habilitação
académica um número de 300 créditos de formação;

-      esta contabilização revela-se completamente desadequada da
oferta disponível nos estabelecimentos de ensino superior público, já
que nenhum deles oferece – no conjunto dos 2 ciclos de formação –
mais do que 251 créditos em unidades curriculares (UC) específicas da
área de arqueologia, descendo esse número para um valor máximo de
201, se considerarmos apenas as UC com componente prática de formação;

-       a APA considera que o principal problema na análise desta
questão radica no facto do RTA se encontrar desajustado aos actuais
contextos de formação académica e exercício profissional, conferindo
ao mecanismo de  apreciação de PATA um peso excessivo, que confunde a
autorização para realização de trabalhos arqueológicos com a
certificação profissional;

-       é para nós essencial rever o RTA, introduzindo, no que a este
tema diz respeito, diferentes níveis de responsabilização individual
e colectiva na execução dos trabalhos;

-       o Estado deve reservar para si a faculdade de autorizar a
realização de trabalhos arqueológicos, baseada numa rigorosa análise
da adequação do plano de trabalhos à situação concreta na qual se
pretende intervir, e deverá ser nesse âmbito que se avalia a
experiência e formação (académica e profissional) do(s) arqueólogo(s)
que se propõem executar o plano de trabalhos em causa.

Mais uma vez, aproveitamos a ocasião para manifestar publicamente a
disponibilidade da APA em contribuir para que o processo de revisão
do RTA e de validação de competências profissionais dos arqueólogos
possa ser o mais rigoroso, transparente e eficaz possível.

A Direcção da APA

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