O que falta aqui é
cidadania, capacidade de intervir em sociedade e, porque não dizê-lo, há por aí
muita apatia e desresponsabilização. Eu acho, por experiência
própria, que o povo português só se levanta em clamor se, das duas, uma: lhes
levarem os santinhos da igreja da aldeia para sé da capital de distrito ou se
lhes quiserem plantar uma linha de muito alta tensão, ou quiçá, uma central de
co-incineração, à porta. Dou o exemplo do
terminal de cruzeiros de Angra do Heroísmo: uma obra de 50 milhões de euros
(isto sem as tão proverbiais derrapagens ou os chamados custos indirectos,
eufemismo que se usa para pagamentos em que o dinheiro se some, sem que se
saiba bem para onde (ou aliás, sabe-se) decidida sem quaisquer estudos de
custo-benefício, sem estudos de impacte ambiental, contra a opinião de muitas
das forças vivas da sociedade local e, ainda por cima, num local classificado
como Parque Arqueológico Nacional e encostada a uma cidade classificada pela
UNESCO como Património Mundial. Cereja no topo do bolo, é um projecto que nunca
funcionará na realidade, pois a natureza dos fundos, de areia e com 15 a 25
metros de profundidade, tal não permite (a não ser, claro, que o dono da obra
seja accionista maioritário de uma cimenteira e não se importe de construir no
Verão para o mar levar no Inverno). A APA escreveu ao
Governo Regional dos Açores (acho que não teve resposta), foram feitas várias
peças em jornais sobre este assunto, reportagens na televisão, debates públicos
– tudo debalde. Criei até uma petição
para entregar às Assembleias da República e Regional dos Açores, fiz queixa
formal destas ilegalidades ao Parlamento Europeu e vou fazer o mesmo, em
Dezembro próximo, numa reunião em Bruxelas, na Unesco. Acham que alguém se
rala? Ninguém. Aliás, o
presidente do Governo Regional dos Açores tem até a desfaçatez de dizer
publicamente que primeiro decide onde construir e que depois logo se faz o
projecto de impacte ambiental e a discussão pública: http://www.ccah.eu/noticias/ver.php?id=2509 Em tempos de crise, mais
ainda do que atacar a parolice ou a absoluta não necessidade da obra/intervenção/”projecto
cultural” importa, primeiro que tudo, perguntar: “quanto custa?”;
“quem paga?”; “quem usufrui?”; “que legislação é
observada/cumprida/respeitada?” E, sempre que possível,
atacar onde lhes dói mais – nas fontes de financiamento, ou seja, junto
da Comunidade Europeia. Finalmente, e fugindo um
pouco ao assunto em cima da mesa, deveríamos todos saber falar a linguagem do
custo-benefício. Ou, como dizia o Artur Côrte-Real, director do Mosteiro de
Santa Clara-a-Velha, nós todos, cidadãos - mas especialmente os que de nós se
encontram ligados ao património e ao ordenamento do território - deveríamos
saber quanto custa construir um quilómetro de auto-estrada. E depois, usando
esse valor, fazer dele bitola para tudo. Assim, sempre que precisássemos de
determinada verba para recuperar determinado património classificado deveríamos
dizer que tal custa 0,01% de um quilómetro de auto estrada. Só mesmo para
(re)colocar as coisas em perspectiva. Por exemplo, quanto custa recuperar e
estudar as Sete Fontes? Certamente bem menos do que os 8,2 Milhões de Euros que
custam os mil metros de estrada que ligam o Hospital de Braga à restante via pública: http://sol.sapo.pt/inicio/Sociedade/Interior.aspx?content_id=6038 PS: para quem tem
curiosidade, o km de auto-estrada custa, em média, 10 Milhões de Euros. Paulo Alexandre Monteiro From:
archport-bounces@ci.uc.pt [mailto:archport-bounces@ci.uc.pt] On Behalf Of Maria Moreira Baptista de
Magalhães Ramalho Quando se fala em projectos culturais destinados a
“reabilitar” o património ou “valorizá-lo”, surgem
muitas vezes apenas duas soluções tipicamente portuguesas - ou se deixa cair ou
se faz um Mega Projecto que pretende colocar “provincianamente” a
cidade ou o Promotor no mapa, procurando um sucesso tipo Guggenheim. Acontece que um dos maiores valores que temos Uma das razões porque julgo importante que se discutam
estes assuntos é porque, apesar de tudo, os arqueólogos ainda fazem ouvir a sua
voz no meio de uma apatia generalizada. Veja-se a recente notícia do Público
sobre as mudanças ao nível da tutela do Património - quem são os que se
preocupam ? Os arqueólogos…. Gostava de deixar claro que apesar de me encontrar ligada
a uma das Instituições que tem como missão pronunciar-se sobre estas matérias,
sempre expus as minhas ideias (dentro e fora da Instituição) com toda a
liberdade que sempre defendi e defenderei e porque considero que é urgente
discutir e argumentar solidamente sobre este tipo de projectos pois eles
perduram e impõem-se nas cidades por muitos e muitos anos. - O primeiro surge junto a um notável monumento
classificado – A Central Tejo – demolindo, ao que parece,
partes do conjunto para edificar esta “Pala”. Centro Cultural – Fundação EDP, projecto
de Amanda Levete. Vejam em anexo imagens retiradas da Agenda Cultural de Lisboa, páginas 122 e 123. Pormenores do texto que destaco: conceito de
“democraticidade” que dizem estar subjacente ao projecto e a
possibilidade de circulação pedonal pelo tecto do edifício, o que me faz
lembrar outro projecto onde essa intenção saiu gorada pelo perigo que
representava para os visitantes - o “Museu do Côa” obrigando a
colocar vedações que desfiguraram a ideia inicial dos arquitectos. Julgo que conhecem outra Pala mais à frente junto ao rio,
por baixo da Ponte 25 de Abril, aquela onde se gastou milhões e que depois
nunca serviu para nada. Muito próximo também ergue-se outro Mega Projecto agora
parado – O Museu dos Coches – lembram-se ? Aquele que
desalojou o ex Instituto Português de Arqueologia e que quase provocou a saída
do Museu Nacional de Arqueologia dos Jerónimos, entre outros efeitos
colaterais. - O segundo é um projecto de
Carrilho da Graça – o Museu Ibérico de Arqueologia e Arte de Abrantes que tem por
missão "apresentar
as colecções de Arqueologia, de
História e de Arte, desde os tempos Pré-Históricos até à Época Contemporânea, tanto
de origem local, regional
e nacional Este edifício,
em forma de paralelepípedo com Sobre este caso deixo-vos também em
anexo umas imagens que, a meu ver,
ilustram bem o que tentei aqui debater. E não me falem de fundamentalismos
que não percebemos nada de modernidade nem de património etc e tal... estou
farta de ouvir só esses argumentos ! Estes debates surgem em todos os
países e é importante que existam para mostrar que não somos todos
amorfos, um bando de carneiros atrás dos " Archistars " !! Maria Ramalho *** ******* This message contains information which may be confidential and privileged. Unless you are the addressee (or authorized to receive for the addressee), you may not use, copy or disclose to anyone the message or any information contained in the message. If you have received the message in error, please advise the sender by reply e-mail and delete the message. |
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