Sim. Está na moda e parece bem violar as convenções e cânones de escrita. Dispensar a pontuação, subverter a lógica da sua aplicação, ordenar os vocábulos de forma caótica numa proposição, intercalar até umas tiradas em latim, desconhecendo em absoluto a gramática latina.
É, sem dúvida, uma atitude esteticamente legítima. Na presunção de que o esteta as conhece e está no seu domínio. E tem a percepção de que, em dadas circunstâncias, as convenções e os cânones da escrita inibem a sua expressão.
Mas o que é curioso é que, da negação das convenções e cânones da escrita decorra a instituição de novas convenções e novos cânones.
Mas o que é mais curioso ainda é mesmo a moda. Aproveitando a maré, aqueles que partem do desconhecimento crasso das convenções e cânones da escrita, podem dividir-se em dois grandes grupos. Aqueles que por ignorância escrevem como calha, uma cambulhada indestrinçável de vocábulos e cúmulo e aqueles que, desconhecendo em absoluto as convenções e cânones da escrita e as razões por que foram instituídas, pretendem instituir uma nova estética literária, caracterizada pela dispensa, sem nexo nem sentido, das convenções e cânones. Ora, convém recordar que a dispensa das convenções e normas da escrita por ignorância resulta em erro. E que, para um leitor atento, o erro não passa despercebido.
Dando um exemplo, eu posso suprimir muitos sinais de pontuação, encadeando as proposições umas nas outras, d forma a que nenhuma se conclua e transite ou flua para a seguinte. Mas se, salvo raras excepções, com a da intercalação de um aposto, eu intercalar uma vírgula entre o sujeito e o predicado de uma proposição, estou a incorrer em erro. Pelo menos, devo estar apto a explicar por que razão o fiz.
Um cúmulo de vocábulos não é um poema. A não ser que eu consiga explicar e o leitor compreender porque razão os vocábulos se encontram em cúmulo e que sentido resulta desse cúmulo.
Foi também por ignorância que um universo quase incalculável de espontâneos vanguardistas aderiram ao acordo ortográfico. Por não compreenderem que as línguas d matriz portuguesa, como a brasileira, já se autonomizaram e revoltaram na afirmação da sua identidade contra a língua mãe, diferenciando-se dela em componentes muito mais significantes do que a ortografia, como são a sintaxe e a semântica.
É fácil entrar na presunção de uma nova e vanguardista elegância literária por ignorância.
Por isso, uma nova geração de arqueólogos e de poetas anda convencida de que é compreensível.
Pudera. Todos lhes batem palmas… Há até quem diga de um paper de um arqueólogo que parece uma écloga de Camões. E pode muito bem ir a Nobel.
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