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[Archport] A cabeça da divindade Endovélico em análise, amanhã!

To :   "archport" <archport@ci.uc.pt>
Subject :   [Archport] A cabeça da divindade Endovélico em análise, amanhã!
From :   José d'Encarnação <jde@fl.uc.pt>
Date :   Fri, 7 Jun 2013 18:18:01 +0100

 

 

 

Peça do Mês

 

O Museu Nacional de Arqueologia (MNA) possui um acervo de muitos milhares, na verdade centenas de milhares, de objectos. Provém eles de intervenções arqueológicas programadas ou de achados fortuitos, tendo sido incorporados por iniciativa do próprio Museu ou por depósito ou por doação o de investigadores e coleccionadores.

Todos os períodos cronológicos e culturais, e também todos os tipos de peças, desde a mais remota Pré-História até épocas recentes, neste caso com relevo para as peças etnográficas, estão representados no MNA. Às colecções portuguesas acrescentam-se as estrangeiras, igualmente de períodos e regiões muito diversificadas.

O MNA é ainda o museu português que possui no seu acervo a maior quantidade de peças classificadas como “tesouros nacionais”.

Existe, pois, sempre motivo de descoberta nas colecções do Museu Nacional de Arqueologia e é esse o sentido da evocação que fazemos, em cada mês que passa, e renovadamente no ano de 2013, em que o MNA celebra o seu 120º aniversário de fundação.

 

 

A peça do mês

Cabeça do deus Endovélico (Nº 988.3.168)

 

A apresentar pelo Dr. José Cardim Ribeiro, em 8 de Junho de 2013 às 15h

 

O “bosque sagrado” de Endovellicus foi, durante o Império Romano, um dos mais importantes santuários de origem paleohispânica localizado no actual território português. O seu culto atrai então numerosos devotos oriundos de uma vastíssima região circundante, de Ebora a Emerita e, muito provavelmente, desde ainda mas longe. Todos eles convergem para o esporão rochoso situado hoje no concelho do Alandroal, próximo da povoação de Terena, actualmente denominado Outeiro de São Miguel da Mota. Aí se localizava o único santuário consagrado a Endovellicus, uma divindade de primordial natureza tópica. Nesse espaço, essencialmente silvano e rupestre, os devotos cultuavam este deus que era ao mesmo tempo infernal, benfazejo e, para alguns, até mesmo heroicizante e salvífico, levando-lhe oferendas frutíferas, sacrificando-lhe porcos e javalis, erigindo-lhe aras e edículas, fazendo-se representar através de estátuas junto das estátuas do próprio nume e procurando escutar-lhe a voz, receber as ordens ou mesmo vislumbrá-lo em sonhos ao pernoitarem ritualmente no santuário (incubatio).

O fundador e primeiro director do Museu Nacional de Arqueologia, José Leite de Vasconcellos, dedicou grande atenção ao estudo do deus Endovellicus, tendo procedido a escavações no local do seu culto e aí recolhido uma vasta colecção de inscrições com dedicatórias e testemunhos de outras oferendas, assim como representações escultóricas de devotos e do próprio deus. Segundo se pensava então – e, de certa forma, se continuou a pensar até há pouco tempo – de entre tão numerosos achados apenas algumas majestosas cabeças barbadas seriam, com maior segurança, identificáveis com a divindade.

Revisões recentes de toda a colecção e ainda novos testemunhos iconográficos descobertos em 2002 permitem hoje, porém, supor com idêntico grau de certeza que alguns torsos desnudos e outras figurações afins devam também eles pertencer à representação plástica de Endovellicus, permitindo-nos assim pela primeira vez reconstituir a imagem do deus na sua quase integralidade.

Na verdade a “peça do mês” é, por tudo isto, não apenas um fragmento escultórico – embora porventura de grande qualidade e expressão, como a cabeça principal atribuível à divindade –, mas sim todas as várias peças que, em conjunto e de forma solidária, nos ajudam hoje a vislumbrar – como se também nós praticáramos a incubatio… – a silhueta do poderoso nume lusitano.

 









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