Ninguém disse que não havia problemas.
O que eu digo é que não há problemas estruturais na arqueologia - para além da precariedade, de não haver carreiras científicas, do imobilismo da DGPC e os projectos de impacte ambiental serem financiados pelos donos das obras, com a contratação dos arqueólogos a ser feita única e exclusivamente com base no menor preço oferecido.
Assédio? Certamente. Ilegalidades, amoralidades? Certamente. Como alguém disse atrás e muito bem, há mecanismos para se lidar com tudo isso. E quem sabe, ou testemunha, deve denunciar. É o que eu faço. Sempre. Se já vi e denunciei coisas que me pareceram pouco éticas, como professores com alunas e professores com alunos em escavações? Claro que sim. Foram contudo fenómenos residuais.
Agora o que vem aqui descrito por esta senhora para a "sua" realidade é estrutural em Portugal? Isso é estratégia para levantar lebres e aparecer nos jornais. Fazer, no fundo, prova de vida já que, muitas vezes, essas pessoas são medíocres cientistas, não tendo palco com a sua obra científica.
O que chateia nestas coisas é, como disse atrás, a má fé e o excesso.
O exemplo do racismo é paradigmático: quando se diz que há racismo estrutural ou que "Portugal é um país racista" como se os países pudessem ser racistas, está-se a criar o soundbyte confrontacional perfeito.
Ninguém com dois dedos de testa vai negar que há discriminação em Portugal, suave, dissimulada. Ou que há racistas. Há,e muitos, basta pegar em muitos dos retornados de 74/75 e falar com um deles, ou falar com as populações do alentejo raiano sobre ciganos.
Mas daí a dizer que Portugal é como o sul da América ou como a África do Sul do Pik Bhotta vai um passo de gigante, que é não apenas ridículo, como plena má fé.
Se "Portugal é um país racista", então somos todos racistas. Mais uma vez, o dogma woke a emular a ICAR, em que somos todos pecadores, maculados à nascença pelo facto de sermos portugueses.
Se "Portugal é estruturalmente racista" então há estruturas em Portugal, montadas pelo Estado, para prevenir que pessoas racializadas tenham acesso à FP, às escolas, à educação
Ora, quem tem ainda bom senso, revolta-se contra esse argumento. Só que, ao fazê-lo, perde a razão - "eh pá, se achas que não há racismo estrutural em Portugal é porque és racista e queres perpetuar o teu lugar de poder" como se nós, precários, desempregados, desfavorecidos tivéssemos alguma vantagem em sermos (mais ou menos) brancos.
Com estas coisas de se trazer para aqui os problemas dos EUA e do Brasil - países que, ao contrário de Portugal, têm grande parte da sua população diretamente traçável até aos tempos da escravatura, com a cor de pele a denunciar esse estigma - ganham apenas os extremistas e os carreiristas que fazem a sua vida académica e profissional à custa de um "moralismo superior", outorgando-se eles como os únicos guardiões do que é ou não é politicamente correto fazer-se. Entretanto, zero avanços na desigualdade económica e social para os restantes 99.9% dos desfavorecidos.
Portanto, Rui, respondendo à tua questão, não acho que existam estruturas problemático-discriminativo-opressivas montadas na Arqueologia.
Acho sim que, como em todo o lado, existem problemas pontuais e que deverão ser os seus protagonistas a lidar com eles, utilizando as ferramentas ao seu dispor e denunciando publicamente a situação quando essas ferramentas não funcionarem.