A propósito do texto infra, actualização do bem conhecido de Raul Solnado, teve o Doutor Luís Torgal a gentileza de prestar um esclarecimento que vale para a História de Portugal, no que concerne à censura em tempos salazaristas. Tomo, por isso, a liberdade de partilhar um e outro - que, nestes tempos, Amigo, como sempre, "rir é o melhor remédio!". Mesmo na História! JdE
-------- Mensagem original -------- De : Luis Torgal <lreistorgal@gmail.com> Data: 10/10/22 21:43 (GMT+00:00) Para: jde@fl.uc.pt Assunto: Re: Os reservistas e a guerra da Ucrânia
Caro Zé
Deixa-me acrescentar uma nota a este sketch actualizado, recordando um nota acerca do "original" do Solnado, que não referi neste livro Brandos Costumes… porque já o referira num artigo que escrevi sobre o Sttau Monteiro, publicado na revista de Loulé.
O famoso sketch do Raul Solnado, A Guerra de 1908, baseado em outro de Manuel Gila, espanhol exilado na Argentina, tem mais significado do que a simples graça do que considero um dos melhores artistas cómicos portugueses. É espantoso como não foi proibido, numa altura de "guerra colonial". Digo isto porque a peça de Sttau Monteiro, A Guerra, que fazia parte do livro Peças em um acto, editada pela Minotauro em 1966, levou à prisão o autor. a um processo militar e ao encerramento da editora. Na verdade era mais difícil exercer a repressão sobre os artistas cómicos e, sobretudo, sobre o popular Solnado.
Grande abraço
Luís Reis Torgal
< jde@fl.uc.pt> escreveu no dia segunda, 10/10/2022 à(s) 19:26: Para o caso de ainda te não ter chegado ao conhecimento. Saúde! José d’Encarnação “FUI MOBILIZADO PELO EXÉRCITO RUSSO PORQUE SOU UM RESERVISTA DA GUERRA DE 1908” Por Raul Solnado
Eu vou-lhes contar a história da minha ida à guerra da Ucrânia. Eu trabalhava numa fábrica de produtos farmacêuticos que paga as férias em Cancun ao Filipe Froes quando um dia, sem querer, deixei cair uma vacina da Covid, despediram-me e o almirante Gouveia e Melo quis levar-me a um conselho de guerra, mas quando cheguei a casa a minha mãe disse-me assim, “Olha lá, tu não podes ir a um conselho de guerra porque não és militar” e a minha tia disse, “Olha, tu podias é responder a este anúncio do jornal” que rezava assim, “Precisa-se soldado, depressa!”. Então o meu tio Gordon Ramsay preparou-me o pequeno-almoço tradicional português com carne do alguidar e ovos estrelados e chamei um Uber para me levar à guerra. Cheguei eram sete horas da manhã, estava a guerra ainda fechada. Mas estava um senhor à porta chamado Vladimir, de tronco nu em cima de um cavalo e eu perguntei, “Faz favor, aqui é que é a guerra da Ucrânia?” E ele disse, “Não senhor! Aqui é a invasão da Crimeia de 2014, a guerra da Ucrânia de 2022 é mais abaixo.” Cheguei lá abaixo e já estavam a abrir as portas da guerra porque eram nove e tal e estava um sentinela chamado Lavrov que me perguntou, “Vens ao anúncio?” e eu disse “Sim, venho” e ele disse “És reservista?” e eu disse, “Acho que sim, participei na guerra de 1908 e na escaramuça com o Francisco Assis em Felgueiras” e então eles deram-me um choco dos camaradas de Setúbal e mandaram usar a tinta preta para me camuflar e depois disseram-me que os ucranianos bombardeavam às segundas, quartas e sextas e a gente bombardeava às terças, quintas e sábados à hora do “Preço Certo” para os apanhar de surpresa e então fui-me embora para a minha guerra e quando cheguei lá estava o Rodrigo Guedes de Carvalho à porta e disse-me, “Olha, podes-te ir embora porque a guerra acabou-se!” E eu disse “Acabou-se??” e ele respondeu “Acabou-se. Veio cá o senhor das audiências e disse que a gente tinha de começar mas é a tratar da décima sexta vaga da pandemia e levaram o Milhazes e o Rogeiro e levaram tudo” e foi assim que ai ai ai ai ai, mas que raio de democracia é esta.
O INIMIGO PÚBLICO - JORNAL “EXPRESSO”
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