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[Histport] Ainda acerca da espada de D. Dinis

To :   "histport" <histport@uc.pt>
Subject :   [Histport] Ainda acerca da espada de D. Dinis
From :   <jde@fl.uc.pt>
Date :   Fri, 28 Oct 2022 20:10:47 +0100

Caros Amigos,
Tendo tido finalmente acesso a fotos pormenorizadas da "espada de D. Dinis", fiquei profundamente chocado!

Penso que o que possa ter acontecido foi isto: encontraram a espada (em 1938) a desfazer-se e não sabiam como lidar com tal situação!

A comissão preparativa das GRANDES COMEMORAÇÔES NACIONAIS DO MUNDO PORTUGUÊS, de 1940, enviou arquitectos, arqueólogos, directores dos museus, ourives, prateiros e seus ajudantes para ver o que havia no país para reerguer, restaurar e adaptar para se fazer COMEMORAÇÕES DIGNAS.
Na questão de arquitectura colocaram imensas ameias, em parte de feitio errado, por cima de muros parcialmente derrubados. Paciência! Porém ficou melhor do que antes estava!
Das igrejas e dos museus requisitaram as peças mais dignas a expor. MUITO BEM!
Dos túmulos que abriram SILÊNCIO TOTAL.

Pergunto-me: com o é que é possível terem aberto o sarcófago de D. Dinis, em 1938, sem terem visto a espada???

Levanto assim a hipótese de que a viram e deram a algum "sábio" para a restaurar na sua dignidade primitiva.
Este pegou no que restava e entregou  "a quem tudo soubesse".

Este pegou nos volumes das obras de VIOLET LE DUC, que muito se apaixonou a desenhar as bainhas e os cintos das espadas medievais, dedicando-lhes muitos desenhos pormenorizados.
Também se devem ter debruçado sobre os volumes do Laking, da Torre de Londres, com imensas fotos de túmulos de espadas medievais e resolveram recriar tudo o que faltava.

O QUE ESTÁ PROFUNDAMENTE ERRADO???

a) O cinturão que não é de cabedal mas de fibra de plantas encanastradas. Tais apenas conheço na Ásia islâmica e de séculos muito posteriores ao século XIV. No século XX ainda se fizeram nas Índias Orientais. (Carbon - 14 dirá resposta!)
b) A ponteira da bainha, na foto ao lado da espada e cheia de "pasta de ferrugem" (resto da lâmina) mostra-nos em que estado o resto da lâmina e da bainha (que não se vêem debaixo de esferovite) devem estar.
c) A abertura da bainha, que se vê numa foto, mostra que a mesma esteve forrada a cabedal normal, muito corroído, em nada condizente com o cinto.
d) A chapa fininha de prata que circula o pomo, bem como as chapinhas redondas nos lados do pomo, também de prata fininhas, não condizem em nada do que então se usou. 
    Ou ferro, ou bronze, ou prata, mas sólida, nunca fininha. Não faz sentido nenhum!
e) Os supostos trabalhos de esmaltes medievais, com meros restos de pinturas esmaltadas, saltaram fora, na maioria dos casos, o que não costuma acontecer com os originais.
f) Não era assim que se aplicava o esmalte:
    Criava-se um filete de parede fino, embutido na base. Este criava compartimentos para as diferentes cores a aplicar. Estes eram preenchidos com pós diferentes. O conjunto ia ao forno e o esmalte derretido aparecia!
g) O que vemos é uma fraca imitação de esmaltes medievais, provavelmente criados no século XX. 
h) As guarnições do cinto. Embora a fivela em boa parte possa ser a original e em prata, é prata maciça, nem oca ou chapeada. Mas parcialmente restaurada parece.
i) O resto das guarnições são repetições do mesmo cunho de ferro, batidos em chapa de prata fininha, o que é característico das ourivesarias portuguesas do século XX. 
   Estas então muitas peças em estilo neo-neu-manuelino criaram, como caixas, pisa-papéis, salvas, cigarreiras, tampas para blocos de apontamentos, tudo para "inglês ver"  e esperado turista "engolir". 
   Precisamente é esta a qualidade que as guarnições nos mostram e que em nada condiz com o século XIV.
j) As guarnições contemporâneas de arreios originais existentes em muitos museus, inclusivamente nos nossos, todas mostram uma base metálica maciça, nunca oca ou batida de forma mecânica, e de qualidade muito superior.

Concluindo, de forma rápida, estamos perante uma desfiguração azarenta do resto de uma boa espada, que alguém tentou fazer "renascer melhor", acabando por a estragar de vez!
A comissão não deve ter aceitado esta monstruosidade e simplesmente ordenado que se metesse dentro do sarcófago, porque não a queriam apresentar para não causar "ESCÂNDALO".

É mais uma triste realidade das nossas incompetências e fraquezas.
Tenho pena, mas a verdade tem de vir ao de cima!
Perdeu-se uma boa chance.

Grande abraço
Rainer Daehnhardt


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