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[Museum] DESPORTO: a deriva do Património mais mal-amado pela Cultura e pela Academia. 1985-2022.

To :   museum <museum@ci.uc.pt>
Subject :   [Museum] DESPORTO: a deriva do Património mais mal-amado pela Cultura e pela Academia. 1985-2022.
From :   Pedro Pereira <pedropereiraoffic@outlook.com>
Date :   Sun, 14 Aug 2022 08:07:01 +0000

 

DESPORTO: a deriva do Património mais mal-amado pela Cultura e pela Academia. 1985-2022.

 

Terem-me voltado a pedir, novamente, insistentemente, uma opinião sobre (a deriva d’) o Museu Nacional do Desporto (instituído legalmente pelo decreto-lei n.º 285/85, de 24 de julho de 1985, e iniciado pelo “Despacho de 1978” do então ministro Sotto-Maior Cardia) motivou este comentário aqui na “Museum”.

Já me tinha afastado há uns anos da questão do Património do Desporto. O meu último contributo ocorreu em 2016, quando fui convidado a “falar disso” na Assembleia da República por ocasião do ano internacional dedicado ao “Desporto, Património da Humanidade” pelo ICOMOS. (O discurso está acedível no “Arquivo da AR”).

Em 2008 propus um “Projecto de Museu Nacional do Desporto”, cuja cerimónia pública decorreu no Parque Eduardo VII em Lisboa. Na qual, o actual Senhor Primeiro-Ministro, na altura Presidente da Câmara de Lisboa, fez um dos discursos de apresentação (juntamente com o Secretário de Estado e o Ministro da Presidência de Conselho de Ministros, perante uma assembleia composta por representantes das instituições desportivas e alguns dos mais reputados atletas e técnicos). Referindo a razão por que apoiava aquele Museu e, até, o conceito museológico que lá era proposto. (O Vídeo dessa apresentação e o documento desse Projecto de Museu estão acedíveis no site do Instituto Português do Desporto e Juventude nas pastas designadas «Museu» e «DICRI»).

Talvez não haja Património mais mal-amado pela Cultura (e pela Academia) do que o de Desporto. O Desporto é aquele domínio do comportamento humano que o status quo e as elites consideram “impuro”. Todos (ou quase) têm vergonha de serem associados a tal assunto. A maioria acha que não lhes dá dividendos nem prestígio numa carreira académica. Esse preconceito tem uma razão de ser, e ela é do foro antropológico, pois essa repulsa tem a ver com a função que a «instituição desporto» executa dentro do Social (dentro do modo de viver em sociedade pelos humanos).

Por isso, talvez valha a pena repetir outra vez, na definição adiante, o entendimento sobre aquilo que me parece que «o Desporto é». E mais à frente, o projecto de Exposição Permanente que o deveria estruturar:

O Desporto é uma resposta cognitiva e comportamental -- individual e colectiva -- aos desafios de um contexto social mais complexo, ocorrido após o Neolítico (sedentarização, acumulação de excedentes, urbanização, aumento da conflitualidade derivada da compressão multiétnica e multicultural). Contribuindo especificamente para a regulação social dos comportamentos humanos no contexto de uma gradual desprogramação dos processos de regulação naturais. Num primeiro momento, em 776 a.C., mais visível na regulação dos comportamentos agonísticos de competição, mas depois, abrangendo também outros. Cujas duas principais operações consistem, por um lado, em submeter os comportamentos a uma arbitragem, regras e regulamentos consensualizados e decididos colectivamente; por outro lado, obrigar a uma paridade e a uma igualdade no reinício dos sucessivos actos de repetição dos comportamentos escolhidos, independentemente dos resultados alcançados nas repetições anteriores. Esta dupla operação, de institucionalização e de igualitarização, constitui o processo usado pelo Desporto para regular socialmente os comportamentos. O Desporto ao ser a regulação social dos comportamentos, quaisquer que eles sejam, permite que ela possa ser feita não apenas com comportamentos cuja intenção é «ganhar» (“altius, citius, fortius”), mas também “perder» ou «empatar». O Desporto, assim sendo, está num nível lógico e de complexidade acima da corporeidade, da motricidade biomecânica e fisiológica, das actividades e práticas físicas exteriorizadas, das acções intencionais, dos jogos, etc. E implica sempre o Social, pois, a arbitragem e os regulamentos são uma intervenção colectiva e colaborativa que age sobre o comportamento individual, independentemente do seu arbítrio, manipulação ou reação.” (Pedro Manuel-Cardoso)

 

 

 

Neste entendimento sobre «o que é o Desporto», (que aceito não estar escrito ainda em nenhum livro de qualquer autor reputado ou designado por uma Academia), a “explicação do Desporto” baseia-se na interdependência entre as seguintes cinco realidades diferentes: «CorpoCognição -- Comportamento (atividades e práticas físicas exteriorizadas, incluindo os jogos) -- Regulação social (desporto) -- Escolha da Relevância-valor (património)». Estas cinco realidades são consideradas variáveis independentes, descontínuas, e de nível lógico e de complexidade diferente (ou seja, não permitem uma relação de causa-efeito direta e sucessiva entre si, apesar de estarem ligadas).

Acresce, ainda, ser necessário considerar que estas cinco variáveis funcionam dentro de um “modelo de compreensão do comportamento humano” possível de objetivar em termos científicos. Isto é, que permita descrever empiricamente a ligação entre a realidade física, biológica, social e cultural às quais cada uma dessas cinco variáveis pertencem. Permitindo, portanto, não apenas, descrever com objetividade esse processo de relação e interdependência; como também, testar e aferir empiricamente esta definição no confronto com a realidade concreta e com os dados históricos. Ou seja, permitir uma demonstração simultaneamente dedutiva e indutiva.

Assim sendo, este entendimento exige um Projeto de Museu (e uma Exposição Permanente) que se lhe adequem. Por exemplo:

 

MUSEU NACIONAL DO DESPORTO

concebido como um

CENTRO DE INTERPRETAÇÃO DO CORPO, ATIVIDADE FÍSICA, JOGOS E DESPORTO

 

centro de ciência, tecnologia, cultura e património |

espaço lúdico, educativo e interativo de compreensão e divulgação do património do corpo, atividade física, jogos e desporto

 

 

 

A EXPOSIÇÃO PERMANENTE DO MUSEU

 

 

 

A EXPERIÊNCIA DE VISITA NO MUSEU

 

CORPO

 

 

 

ATIVIDADE FÍSICA

 

 

 

JOGO

 

 

 

 

 

DESPORTO

 

 

PATRIMÓNIO

 

Þ

 

 

 

Þ

 

 

 

Þ

 

 

 

 

 

Þ

 

 

Þ

 

O CORPO, COMO INSTRUMENTO DO AGIR HUMANO:

A visita a um espaço de análise e experimentação do funcionamento do corpo-cérebro.

A NATUREZA, COMO O GINÁSIO DE TODAS AS ATIVIDADES FÍSICAS: A visita a um espaço de observação e experimentação de todas as modalidades da atividade física humana.

O CÉREBRO, COMO A SALA DOS JOGOS:

A visita a um espaço de observação e experimentação de todos os diferentes modos de jogar (jogos tradicionais, jogos atuais, eGames, jogos Robóticos, RoboCup, jogos de Casino, lotarias e outros).

O DESPORTO NO MUNDO:

A visita ao passado, presente e futuro do Desporto (incluindo os eSports e RobotCup)

O QUE FICA DE RELEVANTE PARA O PRESENTE E PARA OS VINDOUROS:

A visita aos objetos e documentos que permitem conhecer a memória e o património do corpo, atividade física, jogos e desporto.

 

 

 

Pedro Manuel-Cardoso

 

 

 


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