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RE: [Archport] Património


•   To: "'Joana Santos'" <azrael_jo@hotmail.com>, <archport@lserv.ci.uc.pt>
•   Subject: RE: [Archport] Património
•   From: "Filipe Castro" <fvcastro@tamu.edu>
•   Date: Fri, 30 Dec 2005 10:46:54 -0600

Eu acho que a maioria dos profissionais - sobretudo os mais novos - merece o
nosso respeito e a nossa confiança.  Em meu entender são as chefias que têm
toda a responsabilidade pelo estado das coisas.

Antes de vir para os EUA trabalhei brevemente no Ministério do Mar e no
Ministério da Cultura e fiquei com convencido que muitos dos directores
gerais e presidentes e assessores e directores de departamento não tinham
nem a estatura intelectual, nem a rectidão, nem a coragem necessárias para
desempenharem um bom trabalho.

Vindo da privada sempre me confundiu a cultura do respeitinho, os conselhos
que me davam os funcionários mais antigos, quando eu criticava os "senhores
directores" e os "senhores arquitectos" por, por exemplo, nunca meterem os
pés no emprego antes do meio dia: "Cuidaaado! Cuidaaaado!"

Como se eu já fosse a caminho das masmorras do IPPAR por me atrever a dar
uma opinião, condenado sumariamente a passar o resto dos meus dias a pão e
água.  :-)

Uma vez disseram-me que a inveja era a gasolina que fazia andar a função
publica em Portugal.  Todas as generalizações são injustas, mas é verdade
que se tomavam frequentemente decisões informadas por motivos pessoais, às
vezes contra o os interesses da instituição, às vezes contra os interesses
do país, e às vezes contra os próprios interesses do decisor...

E depois, as coisas horríveis que se diziam dos colegas e ficavam no ar, sem
serem rebatidas, discutidas, investigadas!!  Em Portugal (mais uma vez, acho
eu, no espírito da Contra-Reforma) é mais importante quem diz as coisas do
que o que se diz.  Uma vez, numa reunião, eu contradisse um politico muito
importante que estava a ser sanguíneo e miserável em relação a um pedido de
um sindicato e ele no fim veio-me apertar a mão e disse-me muito sério:
"Cuidaaado! Cuidaaaado!" 

E as apreciações subjectivas: "Na América é tudo mais fácil!" Foi a resposta
que me deram quando eu lhes disse que tinha tido as melhores notas do meu
curso.  

Outra eminência explicou-me que também tinha estudado "no estrangeiro", mas
o doutoramento dele tinha sido "a sério", em França!  Toda a gente fez que
sim com a cabeça, e um ainda olhou para mim, com um ar acusador, como quem
diz: O teu doutoramento "não é uma coisa séria". "Na América é tudo mais
fácil".  Eles só meteram um homem na Lua antes dos portugueses por pura
sorte!  :-)

E ficou estabelecido para sempre que o meu doutoramento não é uma coisa.
Volta e meia recebo um email de um amigo a dizer que ouviu falar de mim e
que a opinião geral era que o meu doutoramento não era uma coisa séria.  :-)

Gostava de sublinhar isto:  acho importante não esquecermos que a
responsabilidade última é sempre das chefias.  

Uns porque não sabem mandar, outros porque não sabem organizar, outros
porque não sabem inspirar, outros porque não se ralam.  E é muito injusto
culpar "a classe" ou "os técnicos".

Filipe Castro




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