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Ainda sobre o tema "Hiperexplorados", e em resposta ao curto e-mail de Alexandre Monteiro, julgo ser pertinente dizer que, em parte, ele tem razão. De facto, a "suar a camisola", que seja a nossa...
Contudo, a realidade que afecta a maior parte dos "profissionais" da Arqueologia é outra, e bem indigna. E sublinho a palavra REALIDADE!!! Porque o que acontece na Arqueologia (e, em geral, nas demais actividades económicas do País), é que a maior parte dos que se lançam para a formação de uma "empresa" (com muitas aspas) fazem-no porque, simplesmente, têm aquela ideia funesta de que ser Empresário é não ter compromissos com ninguém, é não ter horários a cumprir, é não ter responsabilidades perante um outro "patrão", é não ter de de se sujeitar a hierarquias superiores, sobretudo se não se souber fazer efectivamente nada relacionado com a Arqueologia (sendo eles supostamente arqueólogos...).
Se muitos em Portugal abrem um cafezito na esquina (mesmo que na rua já existam meia dúzia deles), na Arqueologia abrem-se empresas! E isto torna-se muito pior quando, de repente, essas pessas constatam (que chatice!) que ser empresário dá trabalho e não é só ter bons e faustosos almoços e jantares de trabalho e passear pelo País, de preferência de jipe ou pick-up, a ir às obras onde se encontram os "colaboradores" que efectivamente trabalham... Ser empresário de arqueologia é (teria de ser) ter de se assumir como EMPRESÁRIO, mesmo que isso acarrete um sentido mais negativo. é correr riscos, é investir, é ser previdente, é ser organizado, é estar á frente (ou quando muito ao lado) dos acontecimentos, é ser polivalente, é estar actualizado nas suas áreas (inclusivamente na de Gestão de Empresas). É enfim, uma verdadeira profissão digna desse nome, e não apenas um estado de alma, em que se é empresário às 2.ªas, 4.ªas e 6.ªas e arqueólogo às 3.ªas e 5.ªas (ao sábado não, p orque dá trabalho...).
Resumindo: em tudo na vida, e a Arqueologia não pode nem deve ser excepção (apesar de muitos - demasiados - arqueólogos julgarem que são uma estirpe à parte no mundo do trabalho e empresarial, porque tratam de coisas seriíssimas do espírito e da cultura), se queremos exigir dos outros, temos de dar, em primeiro lugar, o exemplo, sejamos nós empresários ou trabalhadores por conta de outrém ou de nós mesmos.
Saudações a todos
--- Begin Message --- • To: Andre gregorio <andregregorio@hotmail.com>
• Subject: Re: [Archport] Trabalho Digno
• From: Alexandre Monteiro <alexandre.monteiro@gmail.com>
• Date: Fri, 29 Sep 2006 00:12:01 +0100
Estas lamentações - justificadas, quiçá, mas lamentações quand même - trazem-se sempre à memória uma história que me foi contada por um académico americano que, por acaso, conheceu bem Portugal - e a mentalidade dos decisores e operadores portugueses - por aqui ter desenvolvido projectos de investigação na área da arqueologia.
Dizia ele o seguinte:
"Imagina uma estrada, seca poeirenta, sob um sol abrasador. Imagina que por essa estrada caminha um homem. De repente, cruza-se com ele, a mais de cem à hora, um fulano ao volante de um bruto Mercedes, cobrindo de pó, cascalho e gravilha, esfumando-se vertiginosamente no horizonte.
Se o caminhante for americano, irá olhar o carro que se some, à distância e pensará consigo próprio: um dia, hei-de trabalhar tanto e ganhar tanto dinheiro, que hei-de ter um carro daqueles.
Se o caminhante fosse, pelo contrário, português proferiria, alto e bom som, nove em cada dez vezes, o seguinte: sacana, oxalá te espetes no próximo chaparro que te aparecer à frente".
Se é assim tão fácil abrir uma empresa de arqueologia, porque não avançarão para essa etapa os arqueólogos que se sentem explorados?
Em 28/09/06, Andre gregorio<andregregorio@hotmail.com> escreveu:
Venho por este meio deixar mais algumas notas para a reflexão no âmbito da polémica despoletada pela publicitação do famoso mail anónimo que denunciou práticas de hiperexploração de algumas empresas.
Gostaria em primeiro lugar de levantar algumas questões relacionadas com a posição tomada pelos colegas que trabalham para a empresa archeocélis e que vieram a terreiro defender a proprietária dessa empresa.
E gostaria que ficasse bem presente que não se trata de nenhum ataque a estes colegas, que tenho a obrigação de respeitar, e que as questões que irei levantar não se aplicam apenas a estes colegas mas também a outros em situações semelhantes noutras empresas.
Assim, estes colegas afirmam que trabalham há anos para esta empresa. Alguns sempre em contínuo. Perdoem-me a indiscrição da pergunta mas, se trabalham há tanto tempo para essa empresa num regime de exclusividade, têm contrato de trabalho? Sim, daqueles com 13º e súbsidio de férias? e subsídio de almoço? A empresa paga a segurança social devida no escalão respectivo que dá acesso a pensão, baixa e subsídio de desemprego? A empresa tem um seguro que vos abranja?
É que a maioria das empresas de arqueologia deste país dificilmente caberá no que que se pode definir como EMPRESA. Isto é, com quadro efectivo e responsabilizado, com organograma de funcionamento, com o estabelecimento de boas práticas ao nível da higiene e segurança no trabalho, com instalações condignas, com capacidade efectiva de assegurar com meios próprios o tratamento do espólio, a conclusão dos relatórios. Capaz de assegurar controlo de qualidade em todas as práticas da empresa, desde a escavação ou acompanhamento à entrega do relatório.
A maioria das empresas de arqueologia deste país são um telémovel, um computador ligado à net, um carro e uma garagem para guardar a tralha...
Caros colegas, é disto que falamos, salvo raras e honrosas excepções, quando falamos de empresas de arqueologia. A quase totalidade do trabalho é assegurado por profissionais com o mais precário dos vínculos, o recibo verde. Desde o trabalho duro, de pá, picareta e às vezes de marreta, ao trabalho técnico de registo, ao tratamento das fotografias(bem caro por sinal),ao tratamento do espólio, ao relatório, muitas vezes feitos em casa dos próprios profissionais e sem contrapartidas. Acabando o trabalho adeus e até à próxima que há aqui uma pilha de curricula de recém licenciados prontinhos a ir pelo mesmo caminho e de preferência por valores ainda mais baixos.
Os profissionais ficam com os calos, as empresas com os dividendos.
É disto que falamos quando falamos não de exploração mas de hiperexploração. Não se garantem condições nenhumas, apenas se exige, pontualidade, assiduidade, cumprimento de prazos. E horas extraordinárias? Muitas, mas pagá-las? " não dá, não foram orçamentadas"... Não há plano de saúde, não há prémios de produtividade, não há formação profissional.
Que qualidade asseguram estas empresas??? NENHUMA. Os bons resultados são assegurados por profissionais competentes e esforçados. Mais uma vez, quem fica com os dividendos? e quem fica com os calos?
A maioria das empresas de arqueologia deste país é gerida com uma mentalidade digna da nata dos empresários donos de ferraris no Vale do Ave.
Colegas, estou na arqueologia por amor à camisola, mas digo mais uma vez que também não fiz nenhum voto de pobreza. Se dá para viver dignamente, continua-se. Senão, emigra-se ou muda-se de actividade e os senhores dos jipes e dos mercedes que sujem as botas de lama e rebentem as bolhas de picareta na mão! Rapidamente acabarão muitas supostas empresas de arqueologia... Tenho casa para pagar, tenho responsablidades familiares, tenho uma vida digna para viver! Tenho que confessar que me choca profundamente ver profissionais com vínculos mais que precários a defenderem tão denodadamente entidades que os exploram de uma forma tão violenta.
Finalmente, julgo que existe apenas uma forma de fazer face a este estado de coisas: criar uma entidade sócio-profissional que defenda os profissionais da arqueologia e os represente activamente.
E digo criar, porque existe uma associação profissional cujo silêncio perante esta situação de contínua degradação das condições de trabalho e do estatuto sócio-económico dos profissionais da arqueologia é simplesmente revelador da sua inutilidade.
Existem também uma série de outras associações , mas que se preocupam com outras vertentes desta actividade.
Que se possa desde já começar a discutir um estatuto profissional, a estruturação da carreira, o estabelecimento de tectos minimos em termos salariais. Nada disto é novo nem especialmente original. Pratica-se há já muitos anos noutros países, como a inglaterra por exemplo, que tem só o mercado de arqueologia comercial mais dinâmico do mundo.
Que toda esta polémica possa servir para finalmente se darem os passos para a consolidação da nossa actividade em bases bem diferentes das que a regem actualmente, que se possa avançar para a dignificação dos profissionais do nosso ramo e finalmente para a promoção da arqueologia enquanto actividade, enquanto ciência e enquanto forma de criar mais valia patrimonial e cultural para o nosso país.
Com os melhores cumprimentos,
André Gregório
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