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Re: [Archport] Inscrições romanas pintadas. Será sério?

To :   Rogerio Domingos <rogerio.domingos@gmail.com>
Subject :   Re: [Archport] Inscrições romanas pintadas. Será sério?
From :   Alexandre Monteiro <no.arame@gmail.com>
Date :   Mon, 9 Nov 2009 23:08:38 +0000

Bom, não querendo meter a foice em seara alheia, não posso deixar de
dizer que as últimas exposições temporárias do MNA têm sido
excelentes.

Cito, por exemplo, a dos rituais funerários romanos e paleocristãos em
Portugal e a da olaria romana da Quinta do Rouxinol. Para quem, como
eu, costuma ver o período romano por um  canudo, ambas foram um gáudio
para a vista e para os sentidos. Ora, tal só denuncia a vontade que há
(e não só vontade, mas também a capacidade) em inovar, de ensinar, de
mostrar, de enquadrar, de revelar o muito que ainda está no domínio de
poucos e que carece urgentemente de passar a ser do conhecimento de
muitos. Estão, portanto, de parabéns, o director do Museu, o seu
pessoal, e os colaboradores que têm participado na elaboração e
montagem destas exposições temporárias (estas são aquelas coisas que
prometo a mim próprio dizer atempadamente, mas que vão ficando adiadas
sine die).

Dito isto, é preciso dizer que o MNA tem, como uma qualquer outra boa
parcela de imobiliário, três coisas muito boas: a localização, a
localização e a localização. O resto, é o que se vê: quem compara, por
exemplo, as áreas e as serventias do Museu de Angra do Heroísmo
(adaptado a partir de um convento) e o de Portimão (adaptado a partir
de uma fábrica de conservas) com as do MNA, não pode deixar se chocar,
relativamente a este último, com a falta de funcionalidade daquelas
alas e com a exiguidade e precaridade dos seus espaços de trabalho
(pelo menos eram assim há uns anos).

Urge, quiçá, pressionar a tutela para a concepção de um museu novo de
arqueologia por oposição à construção de um outro Museu dos Coches (e,
en passant, caso curioso foi a tutela ter reconduzido, e muito bem, o
director do MNA - pessoa que publicamente criticou, forte e feio, este
processo tragicómico do
faz-museu-desfaz-museu-agora-é-o-da-marinha-agora-é-na-cordoaria - no
seu cargo; o que diz muito das modas em que pára este processo do qual
nunca mais se ouviu falar).






2009/11/9 Rogerio Domingos <rogerio.domingos@gmail.com>:
> Caro Dr. Luis Raposo,
>
> Não foi minha intenção fazer uma critica incisiva ao MNA, mas já que
> estamos de "mangas arregaçadas", deixe-me esclarecer que a última vez
> que visitei o MNA foi há dois (ou talvez três) anos atrás se bem me
> recordo, e nessa altura, a exposição de epigrafia latina estava bem
> diferente do que é apresentado na fotografia que inclui na sua
> mensagem. A sala estava bastante escura, e a iluminação consistia de
> spotlights de tons amarelados, que incidiam individualmente sobre cada
> lápide - algumas das lápides só podiam ser vista em dois lados, os
> outros dois estavam completamente no escuro. Do ponto de vista geral,
> estava muito "in", parecia o lobby de um hotel de cinco estrelas ou de
> uma galeria de arte, mas como museu cientifico e divulgação ao público
> em geral, a exposição falhava bastante, não só pela iluminação como
> também pela falta de material didáctico para uso na sala (haviam
> algumas folhas plastificadas disponiveis) assimo como para ser levado.
> O aspecto do "take away" de informação e imagens é bastante descurado
> pelos museus portugueses - e contribui muito para o divórcio que
> existe entre os Portugueses e os museus em Portugal, pois os museus,
> especialmente os Museus Nacionais, continuam a ser vistos como museus
> para as élites da capital.
>
> Eu serei o último a querer ou poder "aconselhar melhores práticas de
> conservação e fruição das colecções arqueológicas" - não sou
> arqueologo profissional ou museólogo - fiz outras escolhas
> profissionais - mas continuo apaixonado pelo tema e participo como
> posso. De qualquer forma tenho visitado muito museus de arqueologia
> pelo mundo, e permita-me que diga, que enquanto cidadão Português e
> "cliente" (isto é, visitante), penso que o MNA - como museu - não
> serve minimamente o país ou a arqueologia portuguesa. A área de
> exposição é minima, para não dizer insignificante em relação ás
> colecções que sei que o MNA guarda, e estruturada para mostrar os
> "tesouros" da arqueologia portuguesa. A ideia de se querer continuar a
> promover a "arqueologia como procura de tesouros" não serve a
> arqueologia que se faz hoje em dia. Temos que abandonar o conceito de
> museu como "gabinete de antiguidades".  Eu sei também que o actual MNA
> é o sucessor de algo muito mais antigo e o espaço que ocupa nos
> Jerónimos traz problemas adicionais (não só de espaços como também de
> politiquices com os outros stakeholders nos Jerónimos), e que talvez o
> actual MNA seja o melhor que se tem podido fazer dentro dos parâmetros
> que existem.
>
> Atrevo-me contudo a dizer que, na minha óptica, o MNA deveria ser
> extinto, e as colecções redistribuidas por novos museus regionais de
> arqueologia, construídos de raiz, e com amplas áreas de exposição,
> para que as exposições sejam maioiritáriamente permanentes e
> musealizem adequadamente as colecções arqueológicas da região em
> termos cronológicas e por sitios arqueologicos. Posso citar-lhe, a
> exemplo, a villa romana de Milreu em Estoi - um conjunto adequadamente
> protegido e enquadrado para o visitante, contudo os materiais
> arqueológicos que teem vindo a ser recolhidos neste sitio desde o séc
> XIX, estão dispersos pelo MNA, Museu de Faro, Museu de Évora e penso
> também que num museu na Figueira da Foz (além do que está sómente
> armazenado algures). Quem visita Milreu, não tem no Algarve, a
> capacidade de visitar um museu que complete a "história" de Milreu
> como um dos mais importantes sitios arqueológicos do Algarve.
> Visitando o MNA também não o fará, pois só dois bustos encontrados em
> Milreu estão expostos no MNA! Quem diz Milreu, diz Torre de Palma,
> Miróbriga, Tróia, e muitos outros sitios arqueologicos em Portugal.
>
> Sou de opinião que o conceito de museus de arqueologia terá que mudar
> imenso em Portugal - temos que nos afastar de sermos um país de
> grandes museus nacionais centrados em Lisboa, assim como dos museus de
> paróquia ou de Câmara Municipal, que funcionam como sala de festas e
> para sessôes solenes! Seria preferivél termos bons museus regionais,
> "perto" dos sitios arqueologicos de onde proveem as peças, museus que
> contem uma história para a população que não é arqueológa mas que
> poderá ser educada em arqueologia, e porventura passar a ter maior
> sensibilidade para a preservação da nossa herança arqueológica.
>
> Não será á toa que temos um primeiro ministro/governo com especial
> desprezo pela arqueologia - reflecte a sociedade portuguesa em geral,
> que vê a arqueologia como uma ciência de élite para as élites. Os
> museus, como apresentadores do produto final da arqueologia não
> preservada in situ, têem que mudar a forma como exibem a arqueologia e
> terão que fazer marketing como qualquer empresa o faz em conquista do
> seu público, e também - e aqui isto é importante - saber ouvir a
> opinião dos seus "clientes" (os visitantes) e reagir de acordo - um
> museu sem visitantes (ou com números insignificantes) e pouca
> visibilidade no mercado cultural, serve sómente para perpetuar a
> imagem de que museus são a esfera privada de alguns que são pagos pelo
> Estado para fazerem as suas investigações e publicarem obras e
> enriquecerem o seu curriculo académico á conta do erário público.
>
> Como disse de inicio, não quero ser incisivo nos meus comentários -
> não os interprete dessa forma - mas sómente veicular a minha opinião,
> que porventura poderá ser partilhada por muitos dos 10 milhões de
> Portugueses que não arqueólogos ou museólogos. Penso que o propósito
> da ARCHPORT é a partilha de informação assim como a discussão de
> ideias, e dessa forma que subscrevo a lista e nela participo de quando
> em quando!
>
> Melhores cumprimentos
>
> Rogério Domingos
>
>
>
>
>
> 2009/11/9 MNArqueologia/Director - Luis Raposo <mnarq.director@imc-ip.pt>:
>> Em anexo, aspecto da exposição "Religiões da Lusitânia", onde se expõe
>> maioritariamente epigrafia latina, com especiais cuidados de iluminação.
>> Esta iluminação das epígrafes tem sido considerada muito positivamente pelo
>> público em geral e pelos especialistas.
>> O mesmo se diga da secção de epigrafia egípcia.
>> Supomos portanto que não seja em relação aos espaços abertos ao público que
>> o snr. Rogério Domingos tem tamanhas razões de queixa.
>> Já a "reserva do MNA" (e não MNAE) não está aberta ao público, embora seja
>> acessível aos investigadores e escolas. Aí, as condições de iluminação são
>> efectivamente as gerais de espaços não abertos ao público.
>> Aceitamos de bom grado o contributo do prezado snr. Rogério Domingos para
>> nos aconselhar melhores práticas de conservação e fruição das colecções
>> arqueológicas, nomeadamente as que temos em reserva.
>> Trata-se de tema apaixonante, tão velho como Ruskin (da defesa da pureza e
>> na dignidade da ruína, enquanto ruína) e Viollet-le-Doc (na defesa do
>> restauro pesado, segundo o "espírito da época").
>> Proximamente realizar-se-á em Cascais (26 a 28 de Novembro de 2009) um
>> Encontro Internacional em que estas matérias deverão certamente ser
>> abordadas: "A autenticidade e a identidade nas intervenções do património
>> construído". E mesmo sem querer fazer publicidade pessoal, direi que preparo
>> agora uma intervenção a fazer ai sobre "A autenticidade em arqueologia: um
>> terreno de compromissos".
>> Falarei de estátuas pintadas e de monumentos reconstruídos e procurarei
>> reflectir em comum sobre as vantagens e desvantagens de cada uma das opções
>> de fundo em presença.
>> O prezado snr. Rogério Domingos será muito bem-vindo.
>> Luís Raposo
>> Director do Museu Nacional de Arqueologia (MNA)
>>
>>
>> -----Mensagem original-----
>> De: archport-bounces@ci.uc.pt [mailto:archport-bounces@ci.uc.pt] Em nome de
>> Rogerio Domingos
>> Enviada: segunda-feira, 9 de Novembro de 2009 15:12
>> Para: Joaquim
>> Cc: archport@ci.uc.pt
>> Assunto: Re: [Archport]Inscrições romanas pintadas. Será sério?
>>
>> No Römisch-Germanisches Museum  em Colónia, um dos museus de
>> arqueologia romana mais importantes fora de Itália, todas as
>> inscrições romanas estão "pintadas" a vermelho, e segundo me recordo
>> ler num quadro explicativo desse museu, terá existido evidência de que
>> tal seria também feito no periodo em que essas inscrições foram
>> feitas. De qualquer modo, o Doutor José d'Encarnação, mais do que
>> alguém em Portugal, será a pessoa indicada para fornecer uma opinião
>> de peso neste assunto, no que se refere a Portugal. Pessoalmente, não
>> desgosto da "pintura" pois facilita bastante a leitura e apreciação do
>> monumenos epigraficos - a experiência na visita á secção de epigrafia
>> romana do MNAE em Lisboa é péssima, a sala tem pouca luz e as
>> inscrições estão também mal iluminadas o que impossibilita a sua
>> leitura!
>>
>>
>> 2009/11/9 Joaquim <jbatista@esg.ipcb.pt>:
>>> www.porterrasdoreiwamba.blogspot.com
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