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Re: [Archport] In the discipline of archaeology, harassment is occurring at ‘epidemic rates,’ says Stanford scholar

To :   Joana Valdez <joanavaldez@gmail.com>
Subject :   Re: [Archport] In the discipline of archaeology, harassment is occurring at ‘epidemic rates,’ says Stanford scholar
From :   Alexandre Monteiro <no.arame@gmail.com>
Date :   Thu, 1 Apr 2021 21:21:53 +0100

Eu ando sempre a resistir a estas provocações mas depois, tal como acontecia com Oscar Wilde, fraquejo e cedo à tentação. E resisto, quando posso, porque geralmente voto PCP. E, votando-o, concordo com o Safatle, quando diz que  a luta de classes, "a luta contra a desigualdade social e económica é a principal luta política, devendo essa luta submeter todas as demais" de onde deriva que "a esquerda deve ser indiferente às diferenças, deverá até ser uma política da indiferença".

Por outro lado, não posso deixar de ser empático, embora o mal da empatia, como dizia o Bloom, seja o de esta funcionar também como o preconceito: por valorizar o foco em indivíduos, em casos concretos, impede-nos de identificar os problemas estruturais.

Ora, um dos problemas estruturais que acossa estas coisas do assédio no trabalho, em todo ele, não só na arqueologia, mas sim na sociedade em geral, é o do excesso. 

O excesso de se dizer que em Portugal, o "sistema" é tão, mas tão cis/hetero/colonialista/racista/patriarcal, tão configurador de relação tão intensas de domínio do homem sobre a mulher, do catedrático sobre o precário, do velho sobre o jovem, do magro e da atlético sobre os gordos, do hetero sobre @x LGBTXXX*n, do racista sobre o racializado, que TODAS as experiências de trabalho, amorosas, em família, em sociedade, são violentas, abusivas, ilegítimas, opressivas e imorais. Ou seja, a pretexto deste inescapável jugo sistémico, nega-se logo à partida, qualquer agência, qualquer autonomia, da mulher, do homem, do gordo que aprecia "comer demais", do racializado, de quem quer que esteja do que uma "elite intelectual" definiu como o "lado mais fraco".

Tudo isto conduz à infantilização de parte da sociedade e a uma visão maniqueísta da mesma.

És negro? Não tens autonomia, precisas de protecção (de preferência da parte de "bons" homens brancos, em posições de poder académico, das quais não abrem mão, homens que fazem parte do tal sistema, vidé alguns que por aqui comentam e publicam artigos de opinião nos jornais nacionais).

És uma jovem mulher no seio de um grupo de homens arqueólogos? Obviamente, não tens autonomia para dares consentimento ao que quer que seja, o teu género faz de ti automaticamente alguém que só pode ser vítima do "sistema".

Tudo isto esbarra na realidade, que tende a não ser conforme. Nem maniqueísta.

O Chibanga, negro toureiro no Estado Novo.. era vitima ou cumplice?

O Marcelino da Mata, o oficial mais condecorado do Exército português, negro, era boa ou má pessoa? 

A Margaret Thatcher era uma mulher modelo, porque ascendeu a um cargo de poder..  ou era uma má pessoa, neo-liberal e destruidora do sindicalismo?

Os pais dos afro-descendentes negros que decidiram partir em 1974/75 para Lisboa, fugindo dos seus países recém-emancipados, optando deliberadamente por não participar na construção da sua independência, são bons ou maus?

Os reis do Congo, que venderam durante três séculos os seus conterrâneos - na costa a suecos, dinamarqueses, portugueses, americanos, ingleses, espanhóis, franceses e brasileiros; nio interior aos árabes - eram bons ou maus africanos?

O Camões, senhor de um escravo javanês, era boa ou má pessoa? E se o escravo fosse africano, ao invés de indonésio, seria pior pessoa?

Os minuanos, que se aliaram aos Portugueses no Brasil, eram vítimas ou torcionários dos seus conterrâneos? 

António Filipe Camarão, chefe nativo dos índios potiguares, que lutou com os Portugueses na Batalha dos Guararapes, contra os Holandeses e os tupinambás, caetés e tupiniquins, era racista? Genocida? Era um índio bom ou uma pessoa má?

Os rappers negros são bons porque são negros, ou são maus porque são altamente misóginos, machistas, homofóbicos e opressores da mulher? 

Todas as etnias moçambicanas que chegavam à ilha de Moçambique, pendularmente, todos os anos, entre 1550 e 1830, para comerciar com os baneanes da ilha, escolhendo, e sabendo perfeitamente bem, com a sua agência, autonomia e gosto, que padrões de tecidos indianos e que cores e formatos de missangas europeias é que eles achavam estar na moda, naquele ano em concreto, trocando-as por ouro, marfim e escravos e  rejeitando todas as que estavam fora de moda, eram vítimas ou parceiros de negócio?

Eu percebo que esta estratégia dita woke interesse sobremaneira a um nicho de pessoas.

Afinal, há toda uma cultura de pontos e bónus, em que o fustigar em público das carnes suas (e alheias) e o bater extremado das mãos no peito por suas (e nossas, impostas) mui grandes culpas, leva ao subir de nível dos iniciados, em que o atingir do boss level levará a uma sinecura, a uma prebenda, a uma qualquer tenure track, a um lugar vitalício num qualquer comité - vidé a mencionada Barbara Voss, que no seu opus major, um livro de arqueologia de 400 páginas, "The Archaeology of Ethnogenesis: Race and Sexuality in Colonial San Francisco", dá à estampa 13 reles meias páginas de artefactos - o resto é apenas e só queer theory e sua agenda.
É a sempiterna luta pelo poder, já vimos isto na ICAR, nas mais diversas nomenklaturas, no corporativismo ou no lambebotismo da FP, nada que impressione arqueólogos e historiadores, afinal estudar as estruturas do poder é o nosso métier.

O que me chateia nisto tudo é:

a) haver realmente problemas concretos na nossa sociedade;
b) esses problemas concretos serem utilizados como moeda de troca pelo confronto entre duas franjas, dois extremos microscópicos da sociedade - os fascistas da extrema direita e os fascizóides de uma alegada extrema esquerda - quando esses mesmo problemas deveriam ser resolvidos, ou mitigados pelo diálogo e por concessões.
c) provocações como esta não levarem a nada mais nem menos do que à chegificação do eleitorado - acreditem: os ressabiados de direita serão sempre em muito maior número do que os palermas da extrema esquerda.



Em qui., 1 de abr. de 2021 às 07:44, Joana Valdez <joanavaldez@gmail.com> escreveu:
Há efectivamente vários problemas em Arqueologia em termos de condições laborais. Mas o assédio e o bullying são também problemas sérios e que existem também em Portugal. Urge falar sobre estas questões e criar mecanismos para as resolver o mais possível. Não estão dissociadas das questões que mencionou. 

A sua resposta ao e-mail do Rui Gomes Coelho, com uma falta de empatia atroz, foi muito triste e constitui parte do problema. 

Cumprimentos

On Thu, 1 Apr 2021 at 00:21, Ricardo Gaidão <gaidao@hotmail.com> wrote:
Really!!! Oh my God!!!

Pensei que os problemas epidémicos na Arqueologia (portuguesa) estivessem na precariedade profissional, na falta de segurança nos locais de trabalho, nos salários cada vez mais miseráveis, no desinvestimento contínuo nas instituições tutelares da área.



De: archport-bounces@ci.uc.pt <archport-bounces@ci.uc.pt> em nome de Rui Gomes Coelho <ruigomescoelho@gmail.com>
Enviado: quarta-feira, 31 de março de 2021 17:16
Para: Archport <archport@ci.uc.pt>
Assunto: [Archport] In the discipline of archaeology, harassment is occurring at ‘epidemic rates,’ says Stanford scholar
 
https://news.stanford.edu/2021/03/30/harassment-archaeology-occurring-epidemic-rates/

Harassment in the workplace can take many forms. It can be physical – such as nonconsensual sexual contact or quid pro quo coercions – or nonphysical – which includes nonverbal and verbal behavior such as sexually-charged jokes and innuendo, derogatory insults or other bullying comments. Harassment can also be considered discrimination when connected to a target’s identity: gender, sexual orientation, age, race, ethnicity, national origin, class background, queerness and/or disability.

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