ASSOCIAÇÃO TIFLOS, PORTO
Instituição quer lançar biblioteca online para invisuais
Uma biblioteca online, de acesso gratuito para pessoas
invisuais, vai nascer no Porto até Dezembro deste ano. É este o grande projecto
da Tiflos, uma associação de apoio a pessoas com necessidades especiais, criada
em Setembro de 2009.
Paulo Jesus é o mentor da ideia e fundador da associação. Portador de retinite
vascular há oito anos, doença que afecta os olhos, deixou de conseguir ver e
teve que abandonar várias actividades que gostava. “Eu via bem até aos 27
anos, depois tive um problema e fiquei cego. Na altura, foi muito complicado e
deixei de poder fazer uma das actividades que mais gostava que era ver filmes
e, então, resolvi dedicar-me à leitura”, explica. E foi precisamente no
acesso aos áudio-livros que encontrou os primeiros problemas. A oferta era
pouca e muito limitada nos locais de acesso e apesar das facilidades que tinha
em se deslocar, rapidamente se apercebeu que isso não acontecia com a maioria
dos invisuais. “Surgiu-me a intenção de fazer uma biblioteca online para
cegos e comecei a desenvolver a ideia que culminou o surgimento da
instituição”.
Neste momento está a angariar áudio-livros para inseri-los na plataforma
informática onde vai funcionar a Tifloteca, nome escolhido para a biblioteca.
“Já tenho mil livros em texto no computador, principalmente da área
técnica que são aqueles mais difíceis de encontrar”, adianta o
responsável. Mas Paulo Jesus quer ir mais longe e pretende integrar os livros
no formato “DAISY”, um acrónimo de “Digital Accessible
Information System”. Este sistema, ao contrário dos áudio-livros usuais,
permite fazer a ligação entre o texto falado e o escrito de forma sincronizada.
“Este formato permite uma leitura interactiva, o que é muito útil para
estudar e para a leitura de livros técnicos”. Em Portugal estão a ser
dados passos importantes na utilização deste formato e, por exemplo, o Ministério
da Educação já tem vários livros escolares disponíveis em formato DAISY para
apoio aos alunos com deficiência visual. Mas, segundo Paulo Jesus, é um formato
caro e que na grande maioria das vezes utiliza voz sintetizada. “Existe
apenas uma empresa, mas trabalha com voz sintetizada e nós pretendemos
introduzir voz humana, muito mais agradável para quem está a ouvir”.
Numa primeira fase, esta ferramenta vai estar apenas disponível para pessoas
com deficiência visual, já que, segundo a lei portuguesa vigente no que
concerne aos direitos de autor, a reprodução está apenas consagrada para uso de
pessoas com deficiência visual. Mas a associação quer contribuir para mudar
essa premissa que considera restritiva e discriminatória. “Queremos
lançar uma petição online para que a lei seja alargada a outros deficiências,
pois, existem outras pessoas que apesar de conseguirem ver não podem ler um
livro sem ajuda, como, por exemplo, um tetraplégico ou um disléxico”,
justifica o responsável.·
Enquanto instituição particular de solidariedade social a direcção elegeu como
grande missão “melhorar a qualidade de vida de todas as pessoas
portadoras de necessidades especiais residentes em Portugal”. Como tal, a
Tiflos tem outros projectos em desenvolvimento, como é o caso da
Tiflo-solidariedade. “Ajudamos mensalmente nove famílias em que um dos
membros é portador de deficiência, visual ou outra qualquer, a nível de
alimentação, roupa ou situações pontuais que possam surgir”. Para já, a
Tiflos trabalha com famílias da freguesia de Campanhã, num total de 30 pessoas,
através da junta de freguesia local, mas pretende alargar a ajuda a toda a
cidade. “O nosso objectivo é chegar às 15 famílias numa primeira fase,
sempre direccionados para a ajuda a pessoas com deficiência, pois consideramos
que é uma área que não está bem coberta”, refere o responsável.
Outro dos projectos que a associação quer implementar é a Tiflos-massagem, que
consiste na oferta de massagens realizadas por terapeutas com deficiência
visual, ao preço de 10 euros. “Nos dias stressantes que correm, uma
massagem alivia o stress. Além disso, ao aderir a esta ideia está a garantir o
posto de trabalho de uma pessoa cega”, sublinhou Paulo Jesus. A
instituição também quer divulgar talentos, sejam eles de que espécie for.
“Vamos divulgar através do site e possibilitar a compra das respectivas
peças, sejam livros, obras de arte, etc.”.
Actualmente a Tiflos funciona num espaço alugado na zona das Antas e tem ao seu
serviço apenas um funcionário. Não recebe qualquer tipo de subsídio estatal,
pelo que a angariação de fundos é uma das principais dificuldades. “Temos
a nossa loja social, com venda de diversos produtos a preços bem inferiores aos
de mercado e isso permite-nos algum rendimento, mas nada significativo”,
refere o responsável. Na loja, que funciona no mesmo espaço da instituição,
encontra-se um pouco de tudo: colchões, mobiliário, roupas, livros. Tudo é
oferecido à associação que revende o material. “Também colocamos
mealheiros em alguns cafés e restaurantes para quem nos quiser ajudar, pois
precisamos de 10 mil euros para remodelar este espaço e criar condições para a
implementação dos nossos projectos”. Paulo Jesus acredita que até ao fim
do ano vão conseguir o dinheiro que precisam, pois o objectivo é inaugurar a biblioteca
a três de Dezembro, Dia Internacional das Pessoas com Deficiência.
Neste momento, a Tiflos precisa de uma carrinha e de voluntários. Ser sócio
custa 10 euros de inscrição (com oferta de uma massagem) e a quota mensal é de
um euro. “Temos seis voluntários, mas faz-nos falta mais pessoas para
também podermos especializar a nossa ajuda, por exemplo, um canalizador, um
electricista…”, refere Paulo Jesus.
O responsável acredita que os projectos têm capacidade para crescer e que fazia
falta uma associação deste género no panorama social da cidade. “Nós
cuidamos não só do sector da inclusão, mas também do bem-estar das pessoas que
nos procuram”, diz. Agora, falta tratar da parte financeira que vai
suportar a ajuda humana.
Texto e fotos: Milene Câmara, notícia in Confedaração
Nacional de Instituições de Solidadriedade de Julho de 2010