Senhor Professor Doutor
Francisco Sande Lemos:
Esqueça o doutora, já
que não sou médica; os títulos não
fazem as pessoas, as pessoas, com a boa educação, com personalidade e
carácter,
é que fazem os títulos.
Agradeço que tenha
perdido o seu precioso tempo a responder
à minha questão e a atender ao meu reparo, estando, ainda grata por não
ter
ficado sentido com as minhas palavras.
Não lhe levo a mal a
irreverência, já que é sempre um sinal
de juventude.
Respondendo à sua
enumeração, digo-lhe desde já que o plano
prévio existiu de alguma forma, senão como podemos referir as sondagens
prévias
no Castro de Cadem em Calvelo?!
Nunca poderá deduzir
das minhas palavras que indico a falta
de plano prévio, pela ocupação de espaços arqueológicos por estruturas
de obra,
mas pode atribuir-se isso a uma ignorância por parte dos responsáveis
da
preparação da obra ou ainda por má vontade dos mesmos.
Todos sabemos que os
responsáveis pelas obras de construção
não são nenhuns santos (ainda conheço dois ou três), mas o que é certo
é que
nenhum desses sítios constava dos PDM’s ou estava referido em qualquer
Carta
Arqueológica.
Fico satisfeita por
saber que a UAUM seja tão activa na
tentativa de defender o património bracarense bem como na sua
divulgação, e já
agora agradeço a disponibilidade em me elucidar sobre as tentativas
frustradas
da mesma bem como da área de intervenção que lhe compete.
No entanto, acho que as
obras dentro do casco histórico da
cidade seriam mais céleres se houvesse a abertura do mesmo às empresas
privadas
de Arqueologia. Ganhava a cidade, as empresas e a UAUM, que teria
competitividade para poder ter um termo de comparação e justificar a
qualidade
de tão prestigiada instituição – posso sempre dizer que sou o melhor da
minha
rua mas se for o único morador de que é que isso me vale?
Permita-me dizer,
Senhor Professor, que o tempo das
coutadas e dos morgados já lá ficou no século XIX, são dois termos que
não
deviam ser usados nos dias de hoje, quanto muito deviam ser escavados.
Creio que o direito das
pessoas se manifestarem está
inscrito na Constituição da República e, acima de tudo, é um acto de
Democracia.
Não me oponho a isso, e a ilação que retira das minhas palavras é uma
falsa
interpretação.
Não me referia à
manifestação promovida pela ASPA e pela Junta de Freguesia de S.
Víctor, mas, de uma visita noticiada no Correio do
Minho da semana passada, em que o Senhor Doutor, acompanhado pelo
deputado do
PCP, Agostinho Lopes, visitaram a obra do Novo Hospital de Braga.
A referência aos
megafones (desculpe a liberdade poética,
mas megafones foi escrito em sentido figurado) não é um apontar de dedo
a ninguém
específico, só aos responsáveis, com Erre maiúsculo, pela Arqueologia e
Património
da cidade; não ao Senhor Professor dado que, tanto quanto sei, está
aposentado
e estes reparos não lhe dizem respeito.
Da mesma forma, a
“acusação” de omnisciência não lhe era
dirigida. Era sim, e mais uma vez à UAUM como entidade.
Por fim, em relação ao
equívoco, compreendi o conteúdo da
sua mensagem, e quanto à exclusão da Arqueologia das soluções para a
crise,
creio que podemos estar descansados. É do senso comum que existem duas
soluções
básicas para as crises económicas: a primeira é a guerra, a segunda são
as
obras públicas – ambas geram riqueza e emprego a curto prazo. Como a
guerra está
fora de questão resta-nos a segunda hipótese que por sua vez provoca
intervenções
arqueológicas.
Não sei se a Marcha das
Sete Fontes foi um sucesso ou não,
espero que sim. O que é certo é que desconhecia essa informação até me
ser
veiculada pelo Senhor Professor.
Joana
Pandora – Uma Bracarense.
Francisco Lemos escreveu:
Dr. Francisco Sande Lemos
Dra. Joana Pandora:
Tenho todo o gosto em
responder ao seu reparo e ás questões que coloca, pedindo que não leve
a mal o tom algo irreverente
de alguns pontos.
1) Da sua própria intervenção
deduz-se que não houve, de facto, um plano prévio para a A3, mas sim
medidas à
posteriori quando a obra se confrontou com o património existente.
Poderia acrescentar algo mais mas julgo desnecessário.
Peço
desculpa por ter-me referido ao Sr. Presidente da República como Cavaco
Silva
sem acrescentar o título de Professor. Um vez em Espanha num almoço
oficioso disse Juan
Carlos e logo vários dos presentes (do PP, um deles o alcaide)
emendaram em voz alta e ar de censura: Dom Juan Carlos. Não
aprendo com a idade. Mas não voltarei a repetir a graça. Nem em Espanha
nem em
Portugal.
2) Foi em 1989, já se
passaram 21 anos, que a UAUM solicitou publicamente, pela primeira vez,
através
de comunicado difundido pela Imprensa, apoios para um estudo
sistemático do concelho de Braga, dada a
riqueza do património concelhio. Não houve resposta. Inúmeras vezes em
múltiplas
ocasiões, designadamente em conferências abertas ao público da cidade,
sublinhei
a riqueza da Arqueologia do concelho de Braga e a necessidade de maior
intervenção
arqueológica. Se consultar a Revista Forum encontra registo desses
apelos e há
testemunhas.
3) Em 1998 a pedido do
Instituto Português de Arqueologia a UAUM elaborou um parecer negativo
sobre o
PDM de Braga, considerando que não contemplava devidamente o património
arqueológico do concelho. O parecer negativo foi assumido pelo IPA, na
altura
presidido pelo Doutor João Zilhão, o de Boa Memória. No entanto o PDM
foi aprovado.
4) Mais tarde, já no
século XXI, a UAUM solicitou que a zona das Sete Fontes fosse integrada
na sua área
de investigação, não tendo recebido qualquer resposta esclarecedora do
IPA.
5) No concelho de Braga,
em acompanhamentos de auto-estradas, pedreiras, etc têm trabalhado
inúmeras empresas privadas de Arqueologia. A área
de trabalho da UAUM limita-se à chamada zona arqueológica (antigos
núcleos urbanos romano e medieval) e mesmo essa reinvidicação que me
parece
legítima é questionada por entidades oficiais, designadamente pelo
executivo
camarário e em especial pelo Dr. Nuno Alpoim.
8) Pergunta por que
motivo não se estabeleceu um campo de trabalho com alunos na zona da
Setes
Fontes, designadamente no espaço reservado para o Hospital. Bem nesse
caso
seríamos criticados por estar a competir com empresas privadas, a
retirar
oportunidade às intervenções das empresas privadas de Arqueologia que
repito
efectuam habitualmente os estudos de EIA , AIA e acompanhamentos de
toda uma série de obras em Braga, como o Dolce Vita, a Quinta do
Amorim, etc, etc, aliás muito aquém do que seria desejável.
9) Quanto à sua
observação sobre os megafones e a rua julgo que os cidadãos de Braga
têm todo o
direito de se manifestar como o fizeram através da Marcha das Sete
Fontes. Por outro lado suponho
que a Imprensa de Braga ainda é livre e que não é controlada pela UAUM.
De
qualquer modo se considera que há alarme público pode sempre chamar o
corpo de
intervenção. Eu pela minha parte estou inocente. Nem sequer estive na
Marcha,
apesar de concordar com as acções populares, aliás previstas na
Constituição.
Se porventura a Marcha irritou
alguém e teve repercussões é normal em Democracia, o regime ainda
vigente em Portugal.
10) Não sou omnisciente. Sobre a
importância arqueológica da zona pronunciaram-se inúmeras entidades e
pessoas desde há muitos anos.
11) Há um
equívoco. A minha última mensagem era um
alerta para uma eventual tentação do poder em excluir a Arqueologia das
soluções para a crise, incluindo as obras públicas. Ou seja estava
muito para
além do problema específico do novo Hospital de Braga ao qual voltarei
sempre
que considerar necessário. Mas de uma coisa fiquei convencido. A Marcha
das Sete Fontes foi um sucesso, pelo que vejo.
12) Estou aposentado da Universidade do Minho
pelo que todos os meus comentários são de minha exclusiva
responsabilidade.
Francisco Sande Lemos
2009/3/9 Joana Pandora
<joanapandora@gmail.com>
Boa noite
Tenho um reparo a fazer ao texto do Doutor Francisco Sande Lemos.
As obras a que se refere durante o mandato do Professor Cavaco Silva,
nomeadamente da construção da A3 entre Braga e Valença, foram
acompanhadas.
É certo que pelo menos dois estaleiros foram construídos sobre
vestígios importantes antes dos arqueólogos entrarem no terreno.
Refiro-me a um castro perto de S. Martinho de Coura e um "forte em
torrão" na zona de Silva (perto de Valença). De momento em que os
arqueólogos entraram em campo, a obra decorreu segundo a normalidade
prevista e todos os vestígios arqueológicos foram preservados ou o
efeito sobre eles minimizado.
Mais ainda, foram feitas sondagens prévias no Castro de Calvelo,
integrado nas medidas de minimização, sob a alçada da Brisa, uns meses
antes das máquinas chegarem ao terreno.
Em relação ao Novo Hospital de Braga, tenho uma questão dirigida aos
responsáveis pela Unidade de Arqueologia da Universidade do Minho:
Já que desde 1993 se sabe o local de implantação do Novo Hospital,
porque é que a Unidade, com a omnisciência que lhe é característica,
não criou um plano de trabalhos que colocasse os alunos de arqueologia
da UM a caminhar 600 metros e fazer umas sondagens que funcionariam bem
como aulas práticas?
Se se clama nos jornais da zona de Braga, que a obra do Novo Hospital
de Braga é um atentado ao Património, e que estão lá vestígios da Idade
do Bronze e da Época Romana (e da Idade do Ferro digo eu), porque raio
é que não se fez nada antes. Porque é que as pessoas que têm a mão
fechada sobre o Património Arqueológico de Braga não fizeram nada e vêm
agora de megafone para a rua?
A pro-actividade é a melhor forma de salvaguarda ou não me digam que
vão fazer um seguro de incêndio depois da casa ter ardido.
Tenho dito
J. P.
Francisco Lemos escreveu:
Boa Noite!
Braga
necessita de um Novo Hospital como é óbvio. Eu sei disso melhor que
ninguém por experiência pessoal. Mas há espaço para tudo.
O modo como principiaram e se estão a desenvolver as obras do Novo
Hospital de Braga são preocupantes.
O sítio é dos mais sensíveis do concelho de Braga tanto do
ponto
de vista ambiental como arqueológico.
No entanto a obra foi dispensada de AIA e DIA pelo Despacho
n.º 2720/2009. Ora o local já está previsto para ser Hospital desde
1993, conforme o próprio despacho confirma. O despacho apenas se
preocupa com sobreiros e esquece o património ambiental e arqueológico.
Por
outro lado, ao que parece, os procedimentos do promotor da obra, uma
empresa criada a partir de uma parceria pública/privada (Grupo
Mello/Somague/Ministério da Saúde) contrariam os preceitos da
Constituição da República.
Finalmente
considero que está a ser aberto um precedente grave. Por este ou por
aquele motivo dispensam-se as obras de EIA, AIA e DIA. E a minimização
é reduzida a quase zero. Hoje são imperativos de saúde pública. Amanhã
a necessidade urgente de uma nova via rodoviária ou ferroviária.
Já
sob o governo de Cavaco Silva houve obras que foram dispensadas de
qualquer acompanhamento como a auto-estrada entre Braga e Valença que
cortou inúmeros vestígios arqueológicos.
Face
à possibilidade deste Governo, ou de próximos, recorreram de modo
sistemático à dispensa dos habituais mecanismos de avaliação é toda a
Arqueologia de Salvamento que pode desaparecer.
E
se as grandes empresas não tiveram sentido de responsabilidade social,
como felizmente ainda existem em Portugal, então as perspectivas
futuras da Arqueologia parecem-me muito negativas.
Aqui
fica o aviso,
Francisco
Sande Lemos
_______________________________________________
Archport mailing list
Archport@ci.uc.pt
http://ml.ci.uc.pt/mailman/listinfo/archport