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Re: [Archport] Obras do Novo Hospital de Braga

Subject :   Re: [Archport] Obras do Novo Hospital de Braga
From :   Joana Pandora <joanapandora@gmail.com>
Date :   Tue, 10 Mar 2009 22:14:53 +0000

Senhor Professor Doutor Francisco Sande Lemos:

 

Esqueça o doutora, já que não sou médica; os títulos não fazem as pessoas, as pessoas, com a boa educação, com personalidade e carácter, é que fazem os títulos.

 

Agradeço que tenha perdido o seu precioso tempo a responder à minha questão e a atender ao meu reparo, estando, ainda grata por não ter ficado sentido com as minhas palavras.

Não lhe levo a mal a irreverência, já que é sempre um sinal de juventude.

 

Respondendo à sua enumeração, digo-lhe desde já que o plano prévio existiu de alguma forma, senão como podemos referir as sondagens prévias no Castro de Cadem em Calvelo?!

 

Nunca poderá deduzir das minhas palavras que indico a falta de plano prévio, pela ocupação de espaços arqueológicos por estruturas de obra, mas pode atribuir-se isso a uma ignorância por parte dos responsáveis da preparação da obra ou ainda por má vontade dos mesmos.

 

Todos sabemos que os responsáveis pelas obras de construção não são nenhuns santos (ainda conheço dois ou três), mas o que é certo é que nenhum desses sítios constava dos PDM’s ou estava referido em qualquer Carta Arqueológica.

 

Fico satisfeita por saber que a UAUM seja tão activa na tentativa de defender o património bracarense bem como na sua divulgação, e já agora agradeço a disponibilidade em me elucidar sobre as tentativas frustradas da mesma bem como da área de intervenção que lhe compete.

 

No entanto, acho que as obras dentro do casco histórico da cidade seriam mais céleres se houvesse a abertura do mesmo às empresas privadas de Arqueologia. Ganhava a cidade, as empresas e a UAUM, que teria competitividade para poder ter um termo de comparação e justificar a qualidade de tão prestigiada instituição – posso sempre dizer que sou o melhor da minha rua mas se for o único morador de que é que isso me vale?

 

Permita-me dizer, Senhor Professor, que o tempo das coutadas e dos morgados já lá ficou no século XIX, são dois termos que não deviam ser usados nos dias de hoje, quanto muito deviam ser escavados.

 

Creio que o direito das pessoas se manifestarem está inscrito na Constituição da República e, acima de tudo, é um acto de Democracia. Não me oponho a isso, e a ilação que retira das minhas palavras é uma falsa interpretação.

 

Não me referia à manifestação promovida pela ASPA e pela Junta de Freguesia de S. Víctor, mas, de uma visita noticiada no Correio do Minho da semana passada, em que o Senhor Doutor, acompanhado pelo deputado do PCP, Agostinho Lopes, visitaram a obra do Novo Hospital de Braga.

 

A referência aos megafones (desculpe a liberdade poética, mas megafones foi escrito em sentido figurado) não é um apontar de dedo a ninguém específico, só aos responsáveis, com Erre maiúsculo, pela Arqueologia e Património da cidade; não ao Senhor Professor dado que, tanto quanto sei, está aposentado e estes reparos não lhe dizem respeito.

 

Da mesma forma, a “acusação” de omnisciência não lhe era dirigida. Era sim, e mais uma vez à UAUM como entidade.

 

Por fim, em relação ao equívoco, compreendi o conteúdo da sua mensagem, e quanto à exclusão da Arqueologia das soluções para a crise, creio que podemos estar descansados. É do senso comum que existem duas soluções básicas para as crises económicas: a primeira é a guerra, a segunda são as obras públicas – ambas geram riqueza e emprego a curto prazo. Como a guerra está fora de questão resta-nos a segunda hipótese que por sua vez provoca intervenções arqueológicas.

 

Não sei se a Marcha das Sete Fontes foi um sucesso ou não, espero que sim. O que é certo é que desconhecia essa informação até me ser veiculada pelo Senhor Professor.

 

Joana Pandora – Uma Bracarense.






Francisco Lemos escreveu:

Dr. Francisco Sande Lemos



Dra. Joana Pandora:

Tenho todo o gosto em responder ao seu reparo e ás questões que coloca, pedindo que não leve a mal o tom algo irreverente de alguns pontos.

1) Da sua própria intervenção deduz-se que não houve, de facto, um plano prévio para a A3, mas sim medidas à posteriori quando a obra se confrontou com o património existente. Poderia acrescentar algo mais mas julgo desnecessário. 

Peço desculpa por ter-me referido ao Sr. Presidente da República como Cavaco Silva sem acrescentar o título de Professor. Um vez em Espanha num almoço oficioso disse Juan Carlos e logo vários dos presentes (do PP, um deles o alcaide) emendaram em voz alta e ar de censura: Dom Juan Carlos. Não aprendo com a idade. Mas não voltarei a repetir a graça. Nem em Espanha nem em Portugal.

2) Foi em 1989, já se passaram 21 anos, que a UAUM solicitou publicamente, pela primeira vez, através de comunicado difundido pela Imprensa, apoios para um estudo sistemático do concelho de Braga, dada a riqueza do património concelhio. Não houve resposta. Inúmeras vezes em múltiplas ocasiões, designadamente em conferências abertas ao público da cidade, sublinhei a riqueza da Arqueologia do concelho de Braga e a necessidade de maior intervenção arqueológica. Se consultar a Revista Forum encontra registo desses apelos e há testemunhas.

3) Em 1998 a pedido do Instituto Português de Arqueologia a UAUM elaborou um parecer negativo sobre o PDM de Braga, considerando que não contemplava devidamente o património arqueológico do concelho. O parecer negativo foi assumido pelo IPA, na altura presidido pelo Doutor João Zilhão, o de Boa Memória. No entanto o PDM foi aprovado.

4) Mais tarde, já no século XXI, a UAUM solicitou que a zona das Sete Fontes fosse integrada na sua área de investigação, não tendo recebido qualquer resposta esclarecedora do IPA.

5) No concelho de Braga, em acompanhamentos de auto-estradas, pedreiras, etc têm trabalhado inúmeras empresas privadas de Arqueologia. A área de trabalho da UAUM limita-se à chamada zona arqueológica (antigos núcleos urbanos romano e medieval) e mesmo essa reinvidicação que me parece legítima é questionada por entidades oficiais, designadamente pelo executivo camarário e em especial pelo Dr. Nuno Alpoim.

8) Pergunta por que motivo não se estabeleceu um campo de trabalho com alunos na zona da Setes Fontes, designadamente no espaço reservado para o Hospital. Bem nesse caso seríamos criticados por estar a competir com empresas privadas, a retirar oportunidade às intervenções das empresas privadas de Arqueologia que repito efectuam habitualmente os estudos de EIA , AIA e acompanhamentos de toda uma série de obras em Braga, como o Dolce Vita, a Quinta do Amorim, etc, etc, aliás muito aquém do que seria desejável.

9) Quanto à sua observação sobre os megafones e a rua julgo que os cidadãos de Braga têm todo o direito de se manifestar como o fizeram através da Marcha das Sete Fontes. Por outro lado suponho que a Imprensa de Braga ainda é livre e que não é controlada pela UAUM. De qualquer modo se considera que há alarme público pode sempre chamar o corpo de intervenção. Eu pela minha parte estou inocente. Nem sequer estive na Marcha, apesar de concordar com as acções populares, aliás previstas na Constituição. 

Se porventura a Marcha irritou alguém e teve repercussões é normal em Democracia, o regime ainda vigente em Portugal.

10) Não sou omnisciente. Sobre a importância arqueológica da zona pronunciaram-se inúmeras entidades e pessoas desde há muitos anos.

11)  Há um equívoco. A minha última mensagem era um alerta para uma eventual tentação do poder em excluir a Arqueologia das soluções para a crise, incluindo as obras públicas. Ou seja estava muito para além do problema específico do novo Hospital de Braga ao qual voltarei sempre que considerar necessário. Mas de uma coisa fiquei convencido. A Marcha das Sete Fontes foi um sucesso, pelo que vejo.

12) Estou aposentado da Universidade do Minho pelo que todos os meus comentários são de minha exclusiva responsabilidade. 

Francisco Sande Lemos


2009/3/9 Joana Pandora <joanapandora@gmail.com>
Boa noite

Tenho um reparo a fazer ao texto do Doutor Francisco Sande Lemos.

As obras a que se refere durante o mandato do Professor Cavaco Silva, nomeadamente da construção da A3 entre Braga e Valença, foram acompanhadas.

É certo que pelo menos dois estaleiros foram construídos sobre vestígios importantes antes dos arqueólogos entrarem no terreno. Refiro-me a um castro perto de S. Martinho de Coura e um "forte em torrão" na zona de Silva (perto de Valença). De momento em que os arqueólogos entraram em campo, a obra decorreu segundo a normalidade prevista e todos os vestígios arqueológicos foram preservados ou o efeito sobre eles minimizado.

Mais ainda, foram feitas sondagens prévias no Castro de Calvelo, integrado nas medidas de minimização, sob a alçada da Brisa, uns meses antes das máquinas chegarem ao terreno.

Em relação ao Novo Hospital de Braga, tenho uma questão dirigida aos responsáveis pela Unidade de Arqueologia da Universidade do Minho:

Já que desde 1993  se sabe o local de implantação do Novo Hospital, porque é que a Unidade, com a omnisciência que lhe é característica, não criou um plano de trabalhos que colocasse os alunos de arqueologia da UM a caminhar 600 metros e fazer umas sondagens que funcionariam bem como aulas práticas?

Se se clama nos jornais da zona de Braga, que a obra do Novo Hospital de Braga é um atentado ao Património, e que estão lá vestígios da Idade do Bronze e da Época Romana (e da Idade do Ferro digo eu), porque raio é que não se fez nada antes. Porque é que as pessoas que têm a mão fechada sobre o Património Arqueológico de Braga não fizeram nada e vêm agora de megafone para a rua?

A pro-actividade é a melhor forma de salvaguarda ou não me digam que vão fazer um seguro de incêndio depois da casa ter ardido.

Tenho dito

J. P.


Francisco Lemos escreveu:
Boa Noite!

Braga necessita de um Novo Hospital como é óbvio. Eu sei disso melhor que ninguém por experiência pessoal. Mas há espaço para tudo.

O modo como principiaram e se estão a desenvolver as obras do Novo Hospital de Braga são preocupantes.

O sítio é dos mais sensíveis do concelho de Braga tanto do ponto de vista ambiental como arqueológico.

No entanto a obra foi dispensada de AIA e DIA pelo Despacho n.º 2720/2009. Ora o local já está previsto para ser Hospital desde 1993, conforme o próprio despacho confirma. O despacho apenas se preocupa com sobreiros e esquece o património ambiental e arqueológico.

Por outro lado, ao que parece, os procedimentos do promotor da obra, uma empresa criada a partir de uma parceria pública/privada (Grupo Mello/Somague/Ministério da Saúde) contrariam os preceitos da Constituição da República.

Finalmente considero que está a ser aberto um precedente grave. Por este ou por aquele motivo dispensam-se as obras de EIA, AIA e DIA. E a minimização é reduzida a quase zero. Hoje são imperativos de saúde pública. Amanhã a necessidade urgente de uma nova via rodoviária ou ferroviária. 

Já sob o governo de Cavaco Silva houve obras que foram dispensadas de qualquer acompanhamento como a auto-estrada entre Braga e Valença que cortou inúmeros vestígios arqueológicos.

Face à possibilidade deste Governo, ou de próximos, recorreram de modo sistemático à dispensa dos habituais mecanismos de avaliação é toda a Arqueologia de Salvamento que pode desaparecer.

E se as grandes empresas não tiveram sentido de responsabilidade social, como felizmente ainda existem em Portugal, então as perspectivas futuras da Arqueologia parecem-me muito negativas.

Aqui fica o aviso,

Francisco Sande Lemos


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